Donald Trump e Kamala Harris realizaram na terça-feira à noite na Filadélfia o primeiro debate entre ambos na campanha eleitoral para a presidência dos EUA.
Logo no começo, eles apertaram as mãos — mas o clima amistoso acabou ali.
Em 90 minutos inflamados, Harris tirou o ex-presidente do sério com ataques pessoais que tiraram seu foco e aumentaram a temperatura deste embate, que era muito aguardado por todos.
Suas provocações sobre o tamanho das multidões nos seus comícios, seu comportamento durante a invasão ao Capitólio, em Washington, e críticas de ex-integrantes de seu governo à campanha deixaram Trump na defensiva.
O padrão que se viu no debate foi de Harris provocando seu rival republicano a fazer defesas demoradas sobre seu comportamento e comentários passados. Ele aceitou isso, subindo de tom e balançando a cabeça.
Os americanos deveriam ir a um comício de Trump, Harris disse em uma pergunta sobre imigração, porque os eventos são esclarecedores. "As pessoas começam a ir embora mais cedo por exaustão e tédio", ela disse.
Essa provocação deixou o ex-presidente claramente abalado, e ele passou a maior parte da sua resposta — para uma pergunta que deveria ter sido um dos seus pontes fortes junto ao eleitorado — defendendo o tamanho de seus comícios e diminuindo os eventos dela.
Trump depois se envolveu em uma longa resposta sobre uma notícia que foi desmentida de que imigrantes do Haiti na cidade de Springfield, no Ohio, estavam roubando e comendo animais de estimação dos seus vizinhos.
Se dizem que debates são vencidos ou perdidos pelo candidato que mais aproveita os temas no qual é forte — e se defende ou evita temas nos quais é fraco — então o debate da noite de terça-feira favoreceu a vice-presidente.
Uma pesquisa da CNN com pessoas que assistiram ao debate mostrou que Harris teve um desempenho melhor. Casas de aposta também mostraram isso.
Esse retrato pode ser temporário, mas a tática de Harris de colocar Trump na defensiva ficou clara logo cedo no debate, em perguntas sobre economia e aborto.
Pesquisas de opinião indicam que os americanos estão descontentes com a forma como o governo de Joe Biden — do qual Harris faz parte — lidou com inflação e a economia.
Mas Harris virou a mesa e discutiu propostas de Trump de aumento generalizado de tarifas, que ela apelidou de "imposto de vendas de Trump", e falou sobre o Projeto 2025, um polêmico plano conservador independente para um futuro governo republicano.
Trump voltou a se distanciar do projeto e defendeu seu plano de tarifas, observando que o governo Biden manteve muitas das tarifas que herdou de Trump. Os pontos levantados pelo ex-presidente eram válidos, mas impediram que Trump atacasse Harris em tópicos como inflação e preços dos consumidores.
Sobre aborto, Trump defendeu seu histórico sobre o assunto, dizendo que americanos em todos os espectros políticos queriam que a decisão histórica Roe v Wade que protegeu direitos a aborto fosse revertida — algo que pesquisas de opinião não confirmam. Ele teve dificuldades de esclarecer sua posição e sua resposta foi confusa em alguns momentos.
Já Harris aproveitou a oportunidade para fazer um apelo pessoal emocionado a famílias que enfrentam gravidezes com complicações e que não puderam receber aborto e cuidados em Estados onde isso foi proibido — os Estados com "proibições de Trump ao aborto", nas palavras dela.
"É um insulto às mulheres da América", disse.
Foi uma mensagem cuidadosamente feita em um tema em que Harris possui ampla vantagem em cima de Trump.
Em diversas ocasiões ao longo da noite, Harris colocou Trump na defensiva com alfinetadas e provocações que ele poderia ter ignorado, mas parece ter se sentido obrigado a rebater.
Em um determinado momento, Harris foi questionada sobre posições liberais que ela possui, como no caso da extração de petróleo por fracking, que ela adotara em sua campanha fracassada de 2019 nas primárias democratas e acabou abandonando posteriormente. Ela continuou sendo questionada e acabou respondendo que não recebia esmolas de seu pai rico.
Novamente, o ex-presidente mordeu a isca. Em vez de seguir atacando a vice-presidente por sua mudança de postura — um claro ponto de fraqueza — ele começou sua resposta falando sobre a "fração mínima" de dinheiro que recebeu de seu pai.
Sobre a retirada do Afeganistão, outro ponto de fraqueza para Harris, a vice-presidente mudou de assunto para as negociações de Trump com autoridades do Talebã e seu convite a eles para ir a Camp David. Esse padrão se repetiu ao longo da noite e deu certo.
Republicanos já estão reclamando do que chamaram de favorecimento dos moderadores do debate — os jornalistas David Muir e Linsey Davis, da rede ABC — à vice-presidente. Ambos retrataram Trump com checagem de dados durante o debate.
Mas no fim da noite, foram as respostas de Trump e seu ímpeto de morder todas as iscas jogadas por Harris que marcaram o debate.
E isso era visível no rosto dos dois candidatos. Sempre que seu rival estava falando, Harris exibia uma expressão de perplexidade ou incredulidade. Já Trump fazia cara feia.
Até agora, a campanha de Harris tem hesitado em aceitar um outro debate. Mas depois deste debate, eles pediram quase que imediatamente a realização de outro debate antes de novembro.
Isso por si só já mostra o quanto os democratas acharam que a noite foi de Harris.
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