Um grupo de direita radical com ligações com um coletivo violento de supremacistas brancos está se disfarçando de clube esportivo para recrutar jovens na tentativa de "recriar" uma "cultura guerreira" da Inglaterra, segundo uma investigação da BBC.
O Active Club (AC), que celebra o líder nazista Adolf Hitler como herói, diz ser uma agremiação "pacífica e legal", com foco em amizade masculina e condicionamento físico.
No entanto, o grupo está conectado com o movimento Rise Above Movement (RAM), que teve papel importante na marcha da extrema-direita realizada em Charlottesville, nos Estados Unidos, em 2017.
O especialista em movimentos radicais, Alexander Ritzmann, disse que o grupo está usando "a imagem de um clube esportivo" para construir uma "milícia" cujo foco é "a violência organizada".
Desde a criação do primeiro AC no final de 2020, estima-se que mais de 100 clubes já foram abertos nos EUA, Canadá e Europa.
O grupo chegou no Reino Unido em 2023, e desde então já se estabeleceu na Irlanda do Norte, Escócia e várias regiões da Inglaterra.
Uma investigação da BBC no noroeste da Inglaterra revelou que grupos do AC no Telegram possuem mais de 6 mil assinantes.
O Telegram já fechou grupos do AC em quatro ocasiões, mas eles seguem reaparecendo. A versão mais recente — aberta em meados de agosto — possui quase 1,6 mil assinantes.
Suas redes fechadas contém:
Clubes de luta neo-nazistas usando o nome do AC são promovidos desde 2020 pelo ativista americano da direita radical e fundador do RAM, Robert Rundo.
Rundo, que foi preso na Romênia em 2023 a pedido de autoridades americanas, é um dos acusados pelos tumultos e conspirações ligados à violência nos EUA em 2017.
Em um telefonema de 30 minutos gravado secretamente pela BBC, um dos organizadores nacionais disse que o AC quer "caras que levem as coisas a sério".
Depois de questionar o jornalista sobre sua etnia, nível de condicionamento físico, opinião sobre religião, habilidade com boxe ou artes marciais e capacidade de dirigir, ele disse que o grupo — que só recruta "homens brancos de ancestrais europeus" — tinha "homens literalmente em todas as regiões da Inglaterra".
"Estamos tentando construir um movimento em massa de caras fortes, fisicamente aptos e capazes", disse ele.
Ele acrescentou que o grupo é "pacífico e legal" e que busca formas de não ser fechado, porque seus membros "não poderiam salvar seus familiares e amigos e seu povo se estiverem em celas de prisão".
No entanto, mensagens postadas na página do AC por administradores costumam fazer referência a conflitos violentos futuros e à necessidade de "recriar a cultura guerreira de nossa nação".
Uma postagem pede que os integrantes "vão para as ruas... ou arrisquem sua linhagem ser apagada da existência".
Alexander Ritzmann, pesquisador da organização internacional The Counter Extremism Project e assessor da rede de conscientização para radicalização da Comissão Europeia, diz: "eu nunca vi uma rede extremista de direita crescer tão rápido".
Ele disse que o AC é uma "operação sofisticada" e alertou que se o movimento "puder continuar operando e se multiplicando, a probabilidade é que a violência política direcionada vai aumentar".
Ele disse que o objetivo do grupo é "construir um tipo de milícia que se esconde por trás da imagem de um clube esportivo, enquanto se prepara para violência organizada".
"Quando eles agem com violência, integrantes e grupos não publicam manifestos", diz.
"Isso é diferente de outros tipos de terrorismo de extrema direita, em que, depois do ataque, um manifesto com várias explicações e teorias é publicado."
Ele disse que quando o AC realiza atos de violência, ele "disfarça" isso e "não deixa nenhuma informação sobre suas intenções reais".
"Eles podem querer fazer isso parecer uma briga de bar ou uma briga em um ônibus e um trem, para que não acabem expostos."
Uma pesquisa publicada este ano pelo grupo ativista Hope Not Hate, que combate o extremismo, afirma que o AC possui membros que fizeram ameaças com bomba e que marcharam no National Action, um grupo neonazista hoje proibido no Reino Unido.
Para que um ato seja tratado formalmente como terrorismo por autoridades britânicas, é preciso que ele cumpra alguns requisitos da Lei de Terrorismo de 2000, que inclui violência e danos sérios a propriedade, ter a intenção de intimidação e a intenção de avançar uma causa política, religiosa, racial ou ideológica.
Nick Aldworth, ex-coordenador nacional de contraterrorismo do Reino Unido, diz que as postagens do AC no Reino Unido foram "cuidadosamente redigidas para evitar despertarem a atenção da legislação, e elas fazem pedidos deliberados por ações sem violência".
"No entanto, sua intenção está em contradição clara com os símbolos e imagens que deixam implícita a ligação com atos violentos e com o nazismo."
Ele disse que as postagens "chegam no limite de estar na alçada da Lei de Terrorismo".
Nigel Bromage, da entidade Exit Hate, que combate extremismo, disse que a ascensão do AC no Reino Unido é "preocupante".
Ele disse que o organizador que conversou com a BBC "falou em construir um movimento de massa, então não se trata de números pequenos".
"O objetivo é recrutar um grande número de pessoas que são fisicamente aptas, que vão obedecer muitas regras e que seguirão um regime de disciplina", diz.
"Quando eles dizem que não são violentos, isso é só um aviso para tentar se precaver. Por que estão treinando? Por que estão se exercitando? Por que estão falando sobre coisas sérias? Eu acho que tudo isso são pistas sobre o que eles realmente estão fazendo, que é se preparar para uma guerra racial mítica, que eles acreditam que vai acontecer."
Um representante do órgão antiterrorismo Counter Terrorism Policing disse que a escala da ameaça do terrorismo de direita nos Reino Unido "vem evoluindo constantemente nas últimas duas décadas".
A entidade diz que há um aumento no número de jovens sendo atraídos a essa ideologia através de plataformas de redes sociais e online.
A unidade diz que monitora indivíduos que promovem visões extremistas e que está pronta para agir caso necessário.
Um porta-voz do governo disse que ódio religioso e racial "não tem lugar na nossa sociedade" e que o governo está trabalhando para lidar com ideologias extremistas.
O AC não respondeu ao pedido de entrevistas ou comentários feito pela BBC. A BBC também enviou um pedido de comentário ao Telegram, mas não teve resposta até a publicação deste texto.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta