Na quarta-feira (26/04), o aplicativo de mensagens Telegram foi suspenso pela Justiça Federal do Espírito Santo, após pedido da Polícia Federal numa investigação que volve ataques a escolas.
A medida foi tomada porque a empresa "cumpriu apenas parcialmente a ordem judicial" para fornecer dados de participantes de grupos com conteúdo neonazista dentro do aplicativo.
A PF havia solicitado ao Telegram informações sobre integrantes e administradores de dois grupos online que promovem antissemitismo.
A obtenção desses dados faz parte das investigações sobre o ataque a uma escola da cidade capixaba de Aracruz, realizado por um adolescente de 16 anos no final do ano passado.
Além do bloqueio, o Telegram terá que pagar multa de R$ 1 milhão para cada dia de atraso na entrega das informações.
A decisão, tomada pelo juiz Wellington Lopes da Silva, da Justiça Federal do Espírito Santo, tem respaldo na lei que criou o Marco Civil da Internet e que prevê a possibilidade de plataformas serem retiradas do ar em situações urgentes, quando há risco ou dano iminente a pessoas ou à população.
Ou seja, trata-se de uma medida excepcional para forçar a colaboração de plataformas de internet com as autoridades em casos graves.
Mesmo assim, a suspensão gerou debates nas redes sociais, com algumas pessoas dizendo que ela seria autoritária, uma "censura" ou restrição à liberdade de expressão.
Mas o Brasil não é o único país a aplicar restrições ao Telegram. A Alemanha, por exemplo, já ameaçou banir por completo o aplicativo por temor de que ele estivesse sendo usado por extremistas e para propagar discursos de ódio.
A BBC News Brasil entrou em contato com a assessoria de imprensa do Telegram, mas não recebeu resposta até a publicação desta reportagem.
Em mensagem padrão, enviada de maneira automática após o pedido, a plataforma diz que "está comprometida a proteger a privacidade dos usuários e direitos humanos, como a liberdade de expressão e manifestação".
A BBC News Brasil reúne aqui alguns casos em que Telegram sofreu restrições pelo mundo.
Em janeiro de 2022, o governo alemão ameaçou banir o aplicativo do país, se ele não cumprisse as regras locais de deletar mensagens contendo ameaças de morte ou discurso de ódio e de fornecer informações sobre os autores desses conteúdos.
Durante a pandemia de covid-19 e a implementação de campanhas de vacinação, houve vários embates entre as autoridades alemãs e o Telegram. Isso porque o aplicativo acabou se tornando canal de propagação de notícias falsas sobre o vírus e de mobilização de grupos anti-vacina.
Um grupo de Telegram, por exemplo, compartilhou diversas ameaças de morte ao governador do Estado da Saxônia, depois que ele coordenou os trabalhos de contenção de protestos de rua contra a vacina da covid-19.
Diante da demora do Telegram em agir, após pedidos do governo para que apagasse mensagens com ameaças de morte e identificasse os autores, a ministra do Interior, Nancy Faeser, afirmou que se a empresa não cumprisse as regras ela seria não só multada como também "completamente banida".
Isso faria da Alemanha o primeiro país ocidental a impedir o uso do app em seu território.
Mas, depois disso, em fevereiro de 2022, o governo alemão anunciou que o Telegram havia bloqueado, a pedido das autoridades, 64 contas que estariam propagando desinformação e conteúdo extremista.
Em entrevista ao jornal alemão Süddeutsche Zeitung, a ministra do Interior declarou que a plataforma estava sendo usada cada vez mais para "ameaças contra nosso povo e nossa democracia".
"O Telegram não deve mais ser um acelerador para extremistas de direita, teóricos da conspiração e outros agitadores. Ameaças de morte e outras mensagens perigosas de ódio devem ser excluídas e ter consequências legais", disse ela.
Outro país que aplicou restrições ao Telegram, mas dessa vez em relação ao uso por funcionários públicos, foi a Noruega.
Em março de 2023, o Ministério da Justiça norueguês emitiu um comunicado orientando ministros, secretários e funcionários públicos "de todos os níveis" a deletar o Telegram de celulares e computadores usados para trabalhar.
O TikTok, rede social chinesa, também foi incluído na decisão.
No documento, a ministra Emilie Enger Mehl cita risco de espionagem russa e chinesa como motivo, bem como o fato de redes sociais serem "o fórum favorito de atores potencialmente perigosos e outros que tentam nos influenciar com desinformação e notícias falsas".
A medida vale para funcionários públicos federais, estaduais e municipais. O Telegram rejeitou as acusações e criticou a decisão.
"A preocupação das autoridades norueguesas se baseia no equívoco de que o Telegram seria um app russo."
O Telegram hoje se baseia em Dubai, mas foi criado pelos russo Pavel Durov com a premissa de que os usuários poderiam se comunicar sem controle de governos.
A plataforma se tornou refúgio de dissidentes russos e foi usada para que se mobilizassem e trocassem informações, evitando censura e controle do governo de Vladimir Putin.
Durov, que além de fundador é o CEO do Telegram, deixou a Rússia em 2014 após perder o controle de uma outra empresa que possuía por se recusar a fornecer a autoridades russas dados de ativistas ucranianos.
Ele se fixou em Dubai, de onde opera o Telegram, e hoje possui cidadanias francesa e dos Emirados Árabes Unidos.
A Rússia determinou o bloqueio do Telegram no país em abril de 2018. Mas, em junho de 2020, suspendeu o banimento do app alegando que o fundador Pavel Durov havia se comprometido a colaborar com as autoridades para combater o "terrorismo" e o "extremismo" na plataforma.
Já outros países, como China, Irã e Belarus adotaram medidas para tentar banir o uso do Telegram em seus territórios, depois que a plataforma foi utilizada para organizar manifestações.
A assessoria de imprensa do Telegram diz que o app "teve papel proeminente em movimentos pró-democracia ao redor do mundo, incluindo no Irã, Rússia, Belarus, Mianmar e Hong Kong".
Mas as premissas do app, de evitar ao máximo fornecer dados de seus usuários a autoridades, também teve como efeito a proliferação de grupos extremistas no aplicativo que, segundo autoridades de países como Brasil e Alemanha, propagam discursos de ódio e coordenam ações violentas.
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