Os 27 partidos de oposição da Venezuela anunciaram, neste domingo (2), um boicote às eleições legislativas programadas para 6 de dezembro no país.
Contrários ao regime do ditador Nicolás Maduro, as legendas publicaram um comunicado no site da Assembleia Nacional dizendo que o o pleito será manipulado pelo partido socialista no poder e que participar do processo eleitoral seria "colaborar com a estratégia da ditadura".
"Não somos abstencionistas: não há abstenção quando o que se convoca não é uma eleição. Somos democratas e acreditamos na unidade nacional", diz o texto dos partidos.
"Havendo esgotado todos os nossos esforços, nacional e internacionalmente, para que tenhamos um processo eleitoral competitivo que garanta respeito à vontade soberana do povo, as organizações políticas democráticas da Venezuela expressam ao povo venezuelano e à comunidade internacional que, por unanimidade, decidimos não participar da fraude eleitoral convocada pelo regime de Maduro."
Os partidos também listaram uma série de condições para que as eleições sejam consideradas livres e democráticas.
O conjunto de dez medidas inclui o restabelecimento do direito ao voto a venezuelanos que tenham saído do país, campanha eleitoral com acesso equitativo aos meios de comunicação públicos e privados e a formação de um Conselho Nacional Eleitoral (CNE) independente.
O CNE é o órgão responsável por supervisionar as eleições na Venezuela. Em junho, o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) nomeou cinco titulares e dez suplentes alinhados a Maduro para a liderança do Conselho.
Para a oposição, a manobra "aborta a possibilidade de que os venezuelanos tenham um árbitro eleitoral independente e confiável".
O boicote dos opositores - semelhante ao que aconteceu nas eleições presidenciais de 2018, quando Maduro foi reeleito - era esperado e já havia sido previamente anunciado após a série de intervenções do regime chavista no CNE.
A decisão pode, porém, abrir caminho para uma perda do controle da oposição na Assembleia Nacional. Atualmente, políticos contrários ao regime ocupam 109 dos 167 assentos na sede do Legislativo.
Apesar disso, o TSJ também interferiu na liderança dos quatro principais partidos de oposição no país, conhecidos coletivamente como G4. O grupo é formado pelas legendas Ação Democrática, Primeiro Justiça, Um Novo Tempo e Vontade Popular; este último, o partido de Juan Guaidó.
Na ocasião, o gabinete de Guaidó classificou o TSJ como um "braço judicial da ditadura de Maduro" e acusou o regime de tentar "simular uma falsa oposição para sua próxima armadilha eleitoral".
Neste domingo (2), o opositor também usou as redes sociais para conclamar os aliados a "derrotar o regime", usando a hashtag #UnidadContraElFraude.
"Em unidade, rejeitamos a farsa. Agora devemos mobilizar a maioria que quer viver com dignidade", escreveu Guaidó. "Vamos lutar juntos para escolher o destino do nosso país. Ninguém aceita imposições de um regime moribundo."
Mais de 50 países, incluindo Brasil e Estados Unidos, consideram Guaidó o líder legítimo da Venezuela desde janeiro de 2019, quando ele se proclamou presidente acusando Maduro de ter fraudado as eleições de 2018.
Na ocasião, a oposição argumentou que o ditador e o restante da cúpula do Executivo não tinham legitimidade para comandar o país por causa das fraudes no pleito. Assim, pela linha sucessória, Guaidó (até então presidente da Assembleia) deveria assumir a cadeira de presidente da Venezuela de maneira interina, até que novas eleições livres fossem realizadas.
Assim, a decisão de boicotar a eleição legislativa pode enfraquecer Guaidó, já que ele deve perder sua cadeira no Legislativo.
Há pouco mais de dois meses, Guaidó já viveu uma disputa pelo posto de presidente da Assembleia Nacional, depois que o TSJ decidiu anular o título e declarar o deputado Luis Parra, dissidente da oposição e próximo ao chavismo, como responsável pelo Parlamento.
Parra foi declarado eleito em janeiro, durante processo contestado, para ocupar o cargo.
Na ocasião, Guaidó e seus apoiadores foram impedidos de entrar na Casa e acabaram indo ao auditório do jornal El Nacional, crítico ao regime, para realizar a sessão que definiria o chefe da Assembleia Nacional.
Assim, na prática a Casa hoje tem dois presidentes: Parra (reconhecido pela Justiça e pelo regime) e Guaidó (reconhecido pela oposição e pela maioria dos deputados).
Apesar do boicote às eleições anunciado neste domingo (2), o opositor tem enfrentado dificuldades em manter a oposição unida e, a despeito da crise humanitária do país, o regime de Maduro tem se fortalecido.
Em maio, uma tentativa frustrada de invasão da Venezuela por mercenários ajudou a recrudescer o discurso do ditador contra a interferência externa no país.
No contrato com o grupo mercenário, exibido pelo chefe da investida, o ex-militar das Forças Armadas dos EUA Jordan Goudreau, há uma suposta assinatura de Guaidó - ele nega que seja verdadeira.
Maduro acusa o opositor e Goudreau de terem se encontrado na Casa Branca, residência oficial do presidente dos EUA, em fevereiro, para arquitetar o ataque marítimo com o objetivo de tirá-lo do poder na Venezuela.
O presidente Donald Trump disse que o governo americano não estava por trás da operação e que, se estivesse, não confiaria em um grupo tão pequeno para tal missão.
Mais recentemente, o líder americano minimizou a importância de seu apoio a Guaidó e disse que tê-lo reconhecido como presidente interino não era "muito significativo".
O republicano disse ainda que consideraria possibilidades de diálogo com Maduro, mas depois recuou, e afirmou que só se encontraria com o venezuelano para discutir uma "saída pacífica do poder".
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