Desde 1819, o brasão da Casa Real Dinamarquesafoi alterado quatro vezes: em 1903, 1948, 1972 e 2024.
Nenhuma das três primeiras modificações, entretanto, gerou tamanhã polêmica da última mudança.
O rei dinamarquês, Frederico 10º, soberano da Dinamarca e dos territórios autônomos das Ilhas Faroé e da Groenlândia, surpreendeu alguns historiadores em dezembro de 2024 quando decidiu exibir estes dois territórios com mais destaque no brasão.
Durante 500 anos, o brasão dinamarquês — usado em documentos e selos oficiais e cujos elementos remontam ao século 12 — apresentava três coroas, símbolo da União de Kalmar, entre Dinamarca, Noruega e Suécia, que era governada a partir da Dinamarca, entre 1397 e 1523.
Mas, na versão atualizada, as coroas foram removidas e substituídas pelas figuras de um urso polar e um carneiro, maiores do que as anteriores, para simbolizar a Groenlândia e as Ilhas Faroe, respectivamente.
Segundo o comunicado da Família Real emitido em dezembro, "o rei pretende, por meio de modificações no brasão real estabelecido em 1972, criar um símbolo contemporâneo que reflita os territórios autônomos e tenha em conta a história e a tradição heráldica".
Alguns historiadores, no entanto, consideraram a mudança como uma repreensão a Donald Trump.
Durante seu primeiro mandato como presidente, Trump manifestou interesse em comprar a ilha do Ártico, algo que foi imediatamente rejeitado pelos líderes da Groenlândia.
Mas, no mês passado, o presidente eleito reiterou o seu desejo de que os Estados Unidos comprassem o território dinamarquês.
"Para fins de segurança nacional e liberdade em todo o mundo, os Estados Unidos da América consideram a propriedade e o controle da Groenlândia uma necessidade absoluta", escreveu Trump na sua plataforma Social Truth.
Na segunda-feira (6/1), o presidente eleito dos Estados Unidos voltou ao tema ao dizer que a Groenlândia e o seu povo se "beneficiarão enormemente se e quando se tornar parte da nossa nação".
"Nós a protegeremos e cuidaremos de um mundo exterior muito cruel", escreveu ele. "Vamos tornar a Groenlândia grande novamente!"
Nesta terça-feira (7/1), Trump afirmou que pode tomar o controle do território, assim como do Canal do Panamá, ao dizer que ambos são críticos para a segurança nacional dos Estados Unidos.
Questionado se ele descartaria o uso de força militar ou econômica para assumir o território autônomo dinamarquês ou o canal, ele respondeu: "Não, não posso garantir nada sobre nenhum dos dois".
"Mas posso dizer isso, precisamos deles para a segurança econômica", disse ele a repórteres durante uma entrevista coletiva em sua propriedade em Mar-a-Lago, na Flórida.
Seus comentários foram feitos enquanto seu filho, Donald Trump Jr., estava visitando a Groenlândia.
Antes de chegar à capital Nuuk, Trump Jr. disse que estava indo para uma "viagem pessoal de um dia" para falar com as pessoas e não tinha reuniões planejadas com autoridades do governo.
Quando perguntada sobre a visita de Trump Jr. à Groenlândia, a primeira-ministra dinamarquesa, Mette Frederiksen, disse a jornalistas que "a Groenlândia pertence aos groenlandeses" e que somente a população local pode determinar seu futuro.
Ela concordou que "a Groenlândia não está à venda", mas enfatizou que a Dinamarca precisa de uma cooperação muito próxima com os Estados Unidos.
O primeiro-ministro da Groenlândia, Mute Egede, já havia respondido às ambições de Trump no mesmo tom dizendo: "Não estamos à venda e não estaremos à venda".
Com uma população de 57 mil habitantes, a Groenlândia tem ampla autonomia, mas a sua economia depende em grande parte dos subsídios de Copenhague.
O território abriga uma grande instalação espacial americana. E é de importância estratégica para os Estados Unidos porque está localizado na rota mais curta entre a América do Norte e a Europa.
Além disso, o território autônomo dinamarquês possui importantes reservas minerais.
Horas depois do último discurso do presidente eleito americano no fim do ano passado, o governo dinamarquês anunciou um enorme aumento nos gastos com defesa da Groenlândia.
O rei Frederico aproveitou o seu discurso de Ano Novo para dizer que o Reino da Dinamarca estava unido "até à Groenlândia" e acrescentou que "pertencemos um ao outro".
Mas o primeiro-ministro da Groenlândia também aproveitou o discurso de Ano Novo para pressionar pela independência da Dinamarca, dizendo que a ilha deve libertar-se "das algemas do colonialismo".
Alguns acreditam que, com o seu novo brasão, o rei deixa clara a sua intenção de manter o território no reino da Dinamarca.
O especialista real dinamarquês Lars Hovbakke Sørensen acredita que as mudanças refletem o interesse pessoal do rei no Ártico, mas também enviam uma mensagem ao mundo.
"(O rei) está muito interessado na parte do reino no Atlântico Norte e tem um grande amor por ambas as áreas", disse Sørensen ao canal dinamarquês TV2.
"É importante notar, do lado dinamarquês, que a Groenlândia e as Ilhas Faroé fazem parte do reino dinamarquês e que isso não está sujeito a discussão. "É assim que deve ser marcado", acrescentou.
Mas o especialista lembrou também que esta não é a primeira vez que um soberano dinamarquês usa o brasão para assinalar a sua ascensão ao trono.
Sørensen observou que "há uma longa tradição histórica de aproveitar a mudança de trono para limpar os elementos que adornam o brasão real".
O rei Frederico 9 retirou o falcão islandês em 1948, explicou ele, e a rainha Margarida fez o mesmo em 1972, quando retirou os símbolos de cinco áreas diferentes da Alemanha que já não faziam parte da Dinamarca.
Desta vez foram descartadas as três coroas que simbolizavam a unificação dos reinos nórdicos.
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