A Corte Arbitral do Esporte (CAS) reduziu nesta quinta-feira (17) a pena imposta à Rússia pela Wada (Agência Mundial Antidoping) em 2019, de quatro para dois anos, mas manteve a proibição de o país usar seu nome, bandeira e hino em edições dos Jogos Olímpicos e campeonatos mundiais.
Atletas e times russos poderão competir na Olimpíada de Tóquio, adiada para 2021, e nos Jogos de Inverno de 2022 em Pequim, bem como em mundiais de diversas modalidades, sob bandeira neutra.
Para isso, a CAS estipulou regras: os atletas e demais envolvidos não poderão estar sujeitos a uma sanção imposta por autoridade antidoping; seus uniformes não terão a bandeira da Rússia; e o hino nacional não será tocado ou cantado em nenhum local oficial do evento.
Ficou determinado ainda que o nome do país poderá figurar nas vestimentas, desde que com o mesmo tamanho e destaque da indicação de "atleta neutro", em inglês. O uso das cores vermelha, azul e branca também foi liberado.
Esses itens, assim como a redução pela metade do prazo do banimento, são consideradas vitórias russas, apesar do forte impacto da suspensão.
O comitê olímpico do país declarou ter ficado satisfeito com a confirmação de de que seus atletas não serão punidos individualmente, mas considerou inaceitável o fato de que dirigentes e políticos, entre eles o presidente Vladimir Putin, também não poderão comparecer aos Jogos.
O COI (Comitê Olímpico Internacional) se pronunciou de forma breve sobre o tema, dizendo que ainda avaliará as implicações para os Jogos de Tóquio e Pequim com as federações internacionais e o Comitê Paralímpico Internacional.
Não foram detalhados os critérios para participação de atletas russos em competições individuais e coletivas em Tóquio, bem como nos eventos pré-olímpicos. No basquete, por exemplo, a seleção masculina do país é uma das adversárias do Brasil pela vaga.
As condições estipuladas pela CAS em tese valerão também para a Copa do Mundo de futebol de 2022, no Qatar, que será realizada dentro do período da punição, embora a Fifa nunca tenha manifestado uma posição sobre o tema e suas implicações no esporte que comanda.
A sanção vale de 17 de dezembro de 2020 a 16 de dezembro de 2022. Em 9 de dezembro de 2019, a Wada havia aplicado a punição inicial de quatro anos, mas ela ficou suspensa após a Rússia recorrer à CAS.
A entidade jurídica máxima do esporte mundial, localizada na Suíça, confirmou o veredito da Wada de que a agência de controle de doping da Rússia (Rusada) não está em conformidade. Também impôs multa de US$ 1,3 milhão (R$ 6,4 milhões), a ser paga pela Rusada à agência mundial.
Os argumentos da decisão, tomada por três juízes, não foram divulgados. Isso deve ser feito nas próximas semanas.
A punição inicial da Wada se baseou na acusação de que a Rusada agiu para fraudar resultados de exames de atletas e manipular dados submetidos a órgãos internacionais.
"A Wada está feliz por ter vencido esse caso que fará história", afirmou seu presidente, o polonês Witold Banka. De acordo com ele, a CAS "confirmou claramente nossas conclusões, segundo as quais as autoridades russas manipularam descaradamente e ilegalmente as amostras do laboratório de Moscou, com o objetivo de disfarçar um programa de doping institucionalizado".
Apesar da comemoração, Banka declarou estar desapontado com a redução da pena. Travis Tygart, presidente da agência antidoping dos EUA, disse que o resultado é "fraco" e um "golpe catastrófico" para a integridade do esporte. Ele já havia considerado a primeira decisão, da Wada, insuficiente por "permitir que a Rússia escape de uma proibição completa".
A punição de agora se assemelha à qual o país foi submetido nos últimos Jogos de Inverno, em Pyeongchang-2018. Na ocasião, 169 atletas em conformidade competiram sob as condições impostas de neutralidade e sem símbolos nacionais inclusive em modalidades coletivas, como o hóquei no gelo.
Na Olimpíada do Rio-2016, o COI (Comitê Olímpico Internacional) permitiu que cada federação adotasse seus critérios para permitir ou não os atletas russos. Poucas modalidades baniram os esportistas por completo, entre elas levantamento de peso e atletismo, mas vários deles acabaram barrados em decisões individuais ou desistiram de ir ao evento.
A federação internacional de atletismo, World Athletics, inclusive manteve a suspensão do país em suas competições nos últimos anos.
A Rússia é acusada de manipular laboratórios, incluir amostras falsas em exames e deletar arquivos relacionados a testes positivos de doping nos últimos anos.
O escândalo eclodiu após serem descobertas irregularidades no controle de doping nos Jogos de Inverno de 2014, sediados na cidade de Sochi.
O programa de trapaça era comandado por Grigory Rodchenkov, o antigo presidente da agência antidoping russa. Sua principal ação consistia em trocar amostras de atletas do país-sede, contaminadas com substâncias proibidas, por outras limpas.
Rodchenkov agora vive nos Estados Unidos, sob proteção e em local não divulgado, depois de revelar o esquema que coordenou -de acordo com ele apoiado pelos serviços de inteligência da Rússia- e ter fugido do país.
Neste ano, ele lançou o livro "The Rodchenkov Affair - How I Brought Down Putin's Secret Doping Empire" (O caso Rodchenkov - Como derrubei o império secreto de doping de Putin) e deu uma entrevista à agência AP dizendo que sofre ameaças de morte por ser visto como um traidor na Rússia.
A história dele também é contada no documentário Ícaro, ganhador do Oscar em 2017.
Como parte da resolução do caso de 2014, nos anos seguintes a Rússia concordou em oferecer um conjunto de resultados de testes de seu laboratório em Moscou às autoridades antidoping. Foram esses dados, manipulados por representantes do país, que ocuparam posição central na crise que levou à atual punição.
De acordo com as investigações, a negação e a manipulação de dados pelos russos continuaram depois de a Wada confirmar publicamente, em setembro de 2019, que milhares de arquivos do país haviam sido apagados ou manipulados, e que os dados fornecidos não batiam com os de um banco sobre atletas russos recebido pela organização em 2017.
Em uma reunião complementar em outubro do ano passado para ajudar a explicar as discrepâncias, o ministro do Esporte russo forneceu novos dados à Wada, que quando estudados revelaram evidências de mais manipulações, segundo a agência.
Na ocasião, investigadores reportaram que 145 casos suspeitos poderiam não ser resolvidos, o que levantou a possibilidade de que atletas que trapacearam continuassem disputando competições impunemente.
É por isso que os EUA defendem que nenhum atleta russo deveria competir nos eventos dos próximos anos, algo negado pela decisão da CAS nesta quinta.
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