No dia 23 de julho, terá início o maior evento esportivo do planeta: os Jogos Olímpicos, que nesta edição serão disputados em Tóquio, capital do Japão. São esperados que mais de 11 mil atletas de 204 países estejam na nação do sol nascente para participar das 62 modalidades presentes nas Olimpíadas.
Mas nem sempre foi assim. Os Jogos Olímpicos como conhecemos hoje, chamados inclusive de Olimpíadas Modernas, passaram por um grande processo de reformulação e abertura até chegar a essas quantidades de atletas, países participantes e modalidades. Isso porque a competição teve início na Grécia Antiga, com o primeiro registro datado de 776 a.C., ou seja, há 2.797 anos.
Inicialmente, eram disputados sempre em Olímpia, que deu origem ao nome da competição e cidade que fica a pouco mais de 260 quilômetros de Atenas, capital da Grécia. Apenas atletas gregos participavam dos jogos e as modalidades eram restritas às disputas de corridas, lutas e competições com cavalos. Um detalhe importante: essas provas eram muito (muito!) mais violentas do que hoje em dia, motivadas pelas disputas entre as cidades-estado que compunham o território que chamamos hoje de Grécia.
Apesar da violência, os jogos eram um momento de trégua entre as cidades. Isso acontecia principalmente porque os eventos esportivos na época, assim como as outras atividades lúdicas como o teatro, outro marco cultural da Grécia Antiga, estavam muito mais ligadas à religião do que ao espírito de competição esportiva que move os atletas hoje em dia.
Para entender melhor como se desenvolveu a história dos Jogos Olímpicos, a reportagem de A Gazeta conversou com o professor Otávio Guimarães Tavares da Silva, do departamento de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
Antes mesmo de se tornar um grande evento esportivo, os Jogos Olímpicos possuíam um caráter voltado para a celebração religiosa. Otávio Guimarães explicou que, na Grécia Antiga, todas as atividades tanto de caráter lúdico ou esportivo tinham também marcas da religião. O primeiro registro de competições esportivas disputadas na cidade de Olímpia data de 776 a.C., mas o motivo para o começo da realização dos Jogos Olímpicos ainda é um mistério.
“A origem dos jogos olímpicos da antiguidade na Grécia se confunde um pouco entre mito e história. O primeiro registro estimado é de 776 a.C., quando se começaram a disputar atividades competitivas, sempre em uma mistura do caráter cívico com o caráter religioso. Isso é muito importante na cultura da Grécia Antiga, que essas atividades tinham também um caráter religioso. Mas não se tem uma noção exatamente preciso do porquê do início da celebração dos jogos. Há alguns mitos relacionados à celebração de reis da região do Peloponeso, e também de um caráter religioso, mas que foi aos poucos se desenvolvendo claramente”, disse.
O professor contou que, desde sua criação, a competição já era disputada a cada quatro anos. O que chama a atenção, porém, eram os locais onde os jogos eram disputados: Otávio detalhou serem áreas onde também se praticava o culto à religião, consideradas até santuários. O templo de Zeus, uma das sete maravilhas do mundo antigo, é um desses palcos.
Esse era um dos motivos para que, durante os Jogos Olímpicos, fosse declarada uma espécie de trégua entre as cidades-estado. Os viajantes que se deslocavam pela Grécia Antiga em direção a Olímpia possuíam a garantia de que não seriam atacados ou perseguidos.
“Não havia a sensação dos combates na Grécia Antiga, mas havia a garantia que os peregrinos que estavam indo para Olímpia para participar do evento religioso do qual se incluíam as competições esportivas, tinham a garantia de salvo conduto, de ir para Olímpia e voltar de Olímpia em um prazo x de dias. Mas, de fato, não havia a sensação de todos os combates por causa dos jogos, mas a ideia de respeito a uma trégua na região de Olímpia”, narrou.
A princípio, eram disputados aqueles esportes hoje considerados clássicos. Havia provas de luta, corrida, arremesso de dardos e discos, e competições com cavalos. As competições de luta eram as mais sangrentas, sendo divididas em duas modalidades: o pugilismo e o pancrácio, que era uma luta similar à luta-livre contemporânea e que poderia inclusive ocasionar a morte de um dos participantes.
O termo estádio, utilizado hoje para as arenas que recebem jogos de vários esportes como futebol, vôlei, basquete, atletismo, dentre outros, nasceu na Grécia Antiga. Otávio explicou que as provas de corrida eram disputadas em uma pista com 172 metros de comprimento e, a esta pista, se dava o nome de estádio.
Os estádios da Grécia antiga, porém, eram muito menos confortáveis do que os de hoje em dia. Segundo o professor, não havia arquibancada e os espectadores ficaram em encostas gramadas ao redor da área de competição. Os poucos assentos eram reservados para os nobres e juízes.
“O termo estádio era a distância da corrida de velocidade, que gerou o nome que temos até hoje para o local das competições atléticas. Em Olímpia não havia arquibancadas no estádio, havia uma encosta gramada e que se estima que podiam caber até 60 mil pessoas. Os únicos assentos em pedra existentes eram para os nobres e os juízes, que era um número muito pequeno de assentos, de fato”, apontou.
Além dos Jogos Olímpicos, também havia outras competições esportivas no calendário da Grécia Antiga. Otávio Guimarães contou que estas também possuíam caráter religioso, mas que a maior delas era realmente aquela disputada em Olímpia.
“Além dos jogos olímpicos, existiam na Grécia outros jogos. Como os jogos fúnebres, que eram outras competições também de caráter atlético religiosas, aquelas atividades atléticas estavam dentro de situações de culto. Onde havia estádios, havia também templos. Mas o maior de todos eram os jogos disputados em Olímpia”, citou.
Com a expansão do Império Romano e a dominação da Grécia Antiga, os Jogos Olímpicos foram proibidos de serem realizados. Isso porque, em 380 d.C., o imperador Teodósio I declarou o cristianismo como a religião de estado de todo o império. Por conta do caráter religioso das Olimpíadas e do culto aos deuses da religião politeísta, ou seja, com crença em vários deuses, a sua disputa foi encerrada.
O hiato dos Jogos Olímpicos durou até 1896, quando foram realizados os primeiros jogos da era moderna. A cidade escolhida para receber o evento foi justamente Atenas, capital da Grécia. O professor Otávio Guimarães explicou, porém, que, desde o início do século XIX, foram feitas várias tentativas de retomada das competições de caráter olímpico. O responsável pela retomada da competição foi um francês de família aristocrata nascido em Paris.
Em 1894, o historiador Pierre de Frèdy, o Barão de Coubertin, fundou o Comitê Olímpico Internacional (COI), do qual foi presidente até 1925. Coube ao francês organizar os primeiros Jogos Olímpicos da Era Moderna. Com isso, também foram incorporados uma série de novos esportes que estavam sendo desenvolvidos principalmente na Europa.
“Aí, nós já estamos falando de jogos modernos, que incorporam, além do atletismo, a ginástica, a esgrima, o tênis, enfim, gradativamente os chamados esportes modernos, que estavam surgindo e se desenvolvendo no cenário ocidental foram fazendo parte do programa olímpico. Inicialmente, tinha o atletismo, pela tradição grega, mas também tinha a ginástica, que era um movimento muito forte na Europa no século XIX, a esgrima, o tênis e outras modalidades esportivas. À medida que os jogos foram se tornando populares e importantes, outros esportes foram fazendo parte. Até porque aqueles que praticavam tinham o objetivo de transformar seu esporte em um esporte olímpico”, afirmou.
A retomada das Olimpíadas foi com um caráter já globalizado, tornando-se um evento internacional. A iniciativa, segundo Otávio, visava reunir o maior número possível de países, atletas e de esportes. Para que fosse possível englobar todas as modalidades, inclusive, foram criados também os Jogos Olímpicos de Inverno.
Hoje, como pontuou o professor, há um cuidado para que as Olimpíadas não se tornem um evento inchado. Por isso, é estabelecido um limite de 10 mil a 11 mil atletas presentes na competição. Otávio explicou também que esportes que possuem modalidades tanto masculinas quanto femininas possuem mais chances de serem incorporados às Olimpíadas.
“Há uma série de regras e regulamentos para um esporte se tornar olímpico e, hoje, uma grande dificuldade para combater o gigantismo dos jogos, então há um limite de aproximadamente 10 mil atletas. Para entrar uma modalidade, tem que sair outra e há uma política para que haja 50% de atletas homens e 50% de atletas mulheres, então esportes que tem modalidades masculinas e femininas têm mais chance de fazer parte do programa olímpico do que esportes que não tem. As novas modalidades incorporadas, como escalada indoor, skate e surfe, já entram no programa olímpico com modalidades masculinas e femininas”, colocou.
Os Jogos Olímpicos de Tóquio, originalmente, seriam disputados em 2020. Por conta da pandemia do novo coronavírus, porém, a competição teve de ser adiada para 2021. Otávio contou que, na história das Olimpíadas, já houve cancelamentos, majoritariamente por conta das duas guerras que assolaram o mundo no início do século XX, mas nunca o evento teve de ser adiado.
“Cancelamentos já ocorreram antes. A gente teve jogos olímpicos em 1912, mas não teve em 1916 por causa da Primeira Guerra Mundial. Em 1940, os jogos estavam assinalados curiosamente para Tóquio também, 1936 foi em Berlim. Os jogos de 1940 não ocorreram por causa da Segunda Guerra Mundial. Em 1944 não havia nenhuma cidade indicada, mas também não ocorreram por causa da guerra. E aí nós tivemos a retomada em 1948, em Londres, três anos após o fim da Segunda Guerra Mundial. Então, a gente teve situações de cancelamento, de adiamento, como tivemos agora, é a primeira vez”, finalizou.
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