As transformações e desafios causados pela pandemia do novo coronavírus atingiram todos os setores, no Brasil e no mundo. Porém, especialistas em educação, assim como pais, professores e alunos, concordam que as mudanças ocasionadas pela interrupção de aulas presenciais em decorrência do fechamento de escolas e faculdades estão entre as mais drásticas. Ainda que os computadores e o uso da internet não fossem nenhuma novidade, usá-los de forma exclusiva para garantir o aprendizado foi uma ruptura significativa para a sociedade, com implicações ainda desconhecidas para o futuro.
Aulas de robótica, simulados e correções de redação on-line, recursos audiovisuais dos mais variados e o próprio ensino a distância para o nível superior, nada disso é novidade: os congressos e pesquisas já tratam há anos da transformação digital. Mas a ruptura vista este ano é algo novo, especialmente por não ter sido prevista ou escolhida por ninguém. Então, se faz necessário repensar completamente o que estamos fazendo e por que está sendo tão difícil usar a tecnologia já disponível desde a década de 90, argumenta a consultora em educação, pesquisadora e psicopedagoga Jane Haddad.
Na perspectiva da pesquisadora, as escolas que irão permanecer no mercado pós-Covid são as que melhor se readaptarem pedagogicamente, metodologicamente, economicamente e socialmente, além, é claro, as que conseguirem manter em ordem os novos protocolos de biossegurança.
Ressignificar a forma de avaliar os alunos e pensar em como novos conteúdos serão integrados à grade curricular vão ser exigências a partir de agora. Não adianta colocar uma quantidade excessiva de conteúdo, disciplinas e encher os horários de uma criança, de um adolescente, se não ensinar a usar o conhecimento de forma prática. O ensino híbrido vai ser uma realidade sim, mas como forma de enriquecer e complementar, não substituir a presença do professor ou o espaço físico da escola, constata Jane.
Para a consultora e especialista em Educação Integral do Instituto Ayrton Senna, Cynthia Sanches, as empresas de educação devem ficar atentas: é provável que ao retomar o ensino presencial a transformação digital deixe de ser protagonista, e as habilidades socioemocionais e o processo de aprendizagem passem a ser prioridade. Cabe pensar, segundo ela, em uma personalização do ensino.
A mestra em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e professora alfabetizadora, Paola Forechi, está tendo uma experiência inusitada durante o período de isolamento social. Aluna de Psicologia, ela se vê diariamente no papel de estudante. Porém, tendo filhos em idade escolar e ajudando um sobrinho, é responsável por mediar as atividades escolares dos meninos. E ainda é professora. Justamente por estar vivenciando todas as perspectivas, é que ela afirma a importância de repensar as metodologias de ensino, valorizar mais o professor enquanto mediador e buscar a todo custo democratizar o acesso à internet para não permitir que o conhecimento seja distribuído de forma ainda mais desigual.
É importante destacar que a escola não perderá tão cedo, talvez nunca, o seu lugar social. É nela que processos importantes como a socialização e a aprendizagem estruturada acontecem efetivamente. No entanto, é inegável que a tecnologia é uma aliada e pode ser um acelerador de aprendizagem. Assim como também pode acentuar as desigualdades, caso o acesso para alunos e professores não seja revisto, disse a mãe, aluna e professora.
O vice-presidente do Sindicato das Empresas Particulares de Ensino do Espírito Santo (Sinepe-ES) e diretor de escola, Eduardo Gomes, também concorda que é possível aprender algumas lições com o momento conturbado. Entretanto, é preciso cautela e reflexão para compreender que a escola não pode ser substituída e que qualquer recurso, tecnológico ou não, deve ser visto como uma ferramenta e não como o caminho único para o ensino.
A transformação digital será inevitável, nas palavras do especialista em Políticas Educacionais e coordenador de projetos do Todos pela Educação, Ivan Gontijo. Porém, as desigualdades na educação também vão crescer, caso não sejam oferecidas condições mínimas para alunos, professores e escolas.
A ideia de trazer novos elementos para a sala de aula é incrível, mas precisa ser responsável. Em um futuro bem próximo, a perspectiva é de enfrentar grandes discrepâncias no aprendizado, já que comprovadamente perdemos um pouco durante a adaptação e, claro, com quem não tem infraestrutura adequada para o ensino a distância. Além de uma provável evasão escolar, grande entre os alunos da rede pública, motivada pela crise econômica e também pela quebra de vínculo com o espaço físico, o ambiente escolar, finaliza.
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