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Ansiedade em tempos de pandemia: será que ela vai embora após a vacina?

Ansiedade em tempos de pandemia: será que ela vai embora após a vacina?

A chegada da vacina contra a Covid-19 pode ajudar a reduzir o número de ansiosos no contexto da pandemia? Saiba como driblar o sentimento e se manter mentalmente saudável neste momento

Publicado em 20 de janeiro de 2021 às 02:00- Atualizado Data inválida

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Mulher aplicando a técnica de respiração para buscar a calma e reduzir a ansiedade
Evitar pensamentos catastróficos e contar com uma rede de apoio pode ajudar reduzir a ansiedade. (Shutterstock)

Em meio à correria diária e ao estresse constante, a ansiedade é um dos maiores desafios à saúde mental na atualidade e já era uma realidade para muitas pessoas. Porém, as mudanças na rotina e nas formas de se relacionar, tornaram a ansiedade ainda mais intensificada no contexto da pandemia.

Apesar da urgência da discussão, problemas como a ansiedade e outros que envolvem a saúde mental ainda são muito negligenciados. Essa realidade, inclusive, motivou o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep)  a propor a reflexão sobre o estigma social das doenças mentais na sociedade brasileira aos candidatos na redação do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) deste ano.

Claudia Riecken é neurocientista e escritora especializada em superação de estresse pós-traumático. Ela explica que esses estigmas e impressões ligados à questões mentais acontecem porque, como os problemas relacionados a isso não são visíveis, as pessoas tendem a assumir uma postura reducionista ou de dúvida. “Se alguém quebra um braço, é visível , podemos reconhecer a dor, a doença ou o machucado. Mas quando o sofrimento é da alma, os caminhos de reconhecimento e cura são outros”, esclarece.

Para ela, o fato de as pessoas estarem cada vez mais ansiosas está ligado à forma como nos organizamos. “As incertezas já eram grandes antes da pandemia, por conta da mudança que o padrão de comunicação sofreu. Somos uma espécie tecnológica e a mudança promovida pela tecnologia trouxe uma civilização formigueiro, isto é, passamos a nos comunicar por rastros - no ambiente virtual. Isso gera uma crise de identidade, uma insegurança sobre a realidade e nosso lugar no mundo”, explica.

Ela conta que o autocontrole e autoconhecimento nos ajuda a não perder a mão ao tentar nos adequar a esse mundo novo. "É como se todo mundo já tivesse ido e nós tivéssemos, de algum modo, ficado para trás. Queremos ser válidos, amados, significativos, o risco de sermos insignificantes nos gera medo e, então, surge a ansiedade de fazer algo a respeito”, complementa Cláudia.

Para administrar melhor a mente ansiosa, a principal orientação da neurocientista é manter o contato com a realidade, além de praticar o autoamor. “Interrompa pensamentos catastróficos e tome providências lúcidas, como se alimentar bem, tomar sol e manter práticas de bem-estar”, recomenda.

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É preciso manter o contato com a realidade, além de praticar o autoamor. Interrompa pensamentos catastróficos e tome providências lúcidas

Claudia Riecken
Neurocientista
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É importante não ficar em “piloto automático” e se atentar ao próprio comportamento e ações. "A fisiologia - funcionamento normal do corpo - vem do seu pensamento. Então busque rede de apoio e também interrompa flashbacks emocionais (quando somamos inseguranças atuais com antigas da nossa infância), eles fazem com que você sinta medo até quando não está em perigo”, acrescenta.

Ansiedade e pandemia

A psicóloga Edla Zager, especialista em terapia comportamental, explica que, em primeira instância, a ansiedade tem papel de proteção, pois sem ela não seria possível prevenir adversidades. Sendo assim, em alguma intensidade, todos nós já vivenciamos esse sentimento. “Porém, a ansiedade pode se tornar patológica, configurando-se um transtorno mental que traz consigo prejuízos significativos para a saúde e qualidade de vida”.

A pandemia aparece como um momento muito propício para o desenvolvimento da ansiedade. A chegada da vacina renova as esperanças, mas ainda não dispensa os outros cuidados e, por enquanto, muda pouco a rotina que está sendo vivenciada há quase um ano.

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Embora a chegada da vacina tenha proporcionado alívio, ela também pode favorecer vivências ansiosas

Edla Zager
Psicóloga
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Aspectos próprios da pandemia como a privação do contato social, limitação do direito de ir e vir, restrição de acesso a atividades prazerosas, possibilidade de morte ou perda de alguém próximo, associados ao impacto econômico e maximização do desemprego colaboram para um cenário muito instável. Segundo Edla, estes fatores impulsionam sintomas ansiosos. “Embora a chegada da vacina tenha proporcionado alívio, ela também pode favorecer vivências ansiosas, pois há muitos questionamentos sobre a eficácia dela e também a limitação ao acesso”, diz a psicóloga.

Cuidar da saúde mental também é uma estratégia de proteção contra a Covid-19, tão importante quanto manter o distanciamento social e hábitos de higiene. “Nas possibilidades de cada um, o equilíbrio emocional é um grande aliado para enfrentar situações adversas inerentes a pandemia. Apesar de necessário, manter esse equilíbrio, não é tão simples quanto parece, especialmente no cenário atual. Por isso, contar com suporte de um psicólogo, em muitos casos, é indispensável”, salienta.

Como lidar com a ansiedade

Angelita Scardua fala sobre as questões do isolamento social
A psicóloga especialista em desenvolvimento adulto e felicidade, Angelita Scardua, dá dicas de como minimizar os impactos da ansiedade. (Guilherme Ferrari)

A psicóloga Angelita Scardua, mestre e doutora especializada em Desenvolvimento de Adultos, na experiência de Felicidade e nos estudos da Psicologia Social, afirma que o mais importante para lidar com a ansiedade e não permitir que ela atrapalhe a rotina é abrir mão do controle. “Aceitar que nós não temos controle sobre a maioria das coisas da vida. A expectativa de que é possível planejar e conduzir as coisas é uma das principais causas da ansiedade”, destaca.

De acordo com a especialista, a única coisa sobre a qual temos controle é como iremos lidar com os acontecimentos. E ter controle sobre a própria vida tem a ver com ser capaz de reconhecer os recursos disponíveis - mentais, materiais e físicos - e saber o que pode ser feito com eles. “Com isso em mente, existem duas possibilidades: assumir uma postura de quem não tem recursos para enfrentar o que está acontecendo, se colocar como um coitado, e esse caminho, geralmente, aumenta a ansiedade; ou definir o que pode ser feito para minimizar os impactos negativos e aproveitar as possibilidades que isso me oferece.”

Além disso, atividades práticas, como exercícios físicos regulares, também colaboram para uma maior estabilidade emocional. Isso porque a ansiedade está muito ligada ao estresse, quanto mais estressante for a rotina, maior a chance de a pessoa viver ansiosa. “Praticar atividades físicas é uma maneira de equilibrar nosso sistema endócrino - muito relacionado à regulação das nossas emoções, já que elas são coordenadas pela produção hormonal”, explica Angelita.

E não precisa, necessariamente, fazer academia. "Caminhar com frequência, subir escadas, aulas de dança ou ioga, já são suficientes desde que a prática seja regular”, complementa.

10 dicas para uma vida mais leve

A especialista definiu uma série de hábitos que podem colaborar com a redução da ansiedade e a auxiliar na busca por uma vida mais tranquila.

  • 01

    Elimine os excessos

    “Nós acumulamos coisas desnecessárias e isso gera uma sensação de sufocamento. Então desapegue, desafogue o seu ambiente, deixe o ar circular, a luz do dia entrar. Livre-se dos excessos, sejam eles de roupas, de trabalho, de vícios, de comida ou até de relacionamentos. Você não precisa estar cercado de pessoas, livre-se de relações tóxicas. Isso pode ser difícil, mas se o fato de se relacionar com essa pessoa te causa emoções ruins, se afaste. Se isso não for possível, porque é alguém da sua família, por exemplo, tente evitar ao máximo o conflito”, orienta Angelita.

  • 02

    Medite e atente-se à sua respiração

    Adote a prática da meditação. Caso você não se identifique com ela, mas tem algum tipo de fé, pratique-a diariamente. “A fé, seja ela qual for, contribui muito para diminuição do estresse e controle da ansiedade. Conecte-se com aquilo que você considera divino ou espiritual”, aconselha. A respiração também pode estar associada à meditação, porque, para otimizá-la, é preciso estar atento ao seu corpo, ouvi-lo. “Uma das características da ansiedade é uma respiração descontrolada, então aprenda a observar o funcionamento do seu corpo. Aprenda a controlar a respiração: se você estiver fazendo alguma coisa e começa a respirar muito rapidamente, pare, respire fundo e inspire”.

  • 03

    Dê nome ao que você sente

    “Nós não recebemos educação emocional, então, a maioria de nós não sabe nomear o que está sentindo e isso é muito importante. Se eu não sei exatamente o que estou sentindo, não sei como tentar aliviar esse sentimento. Então é preciso definir se é medo, raiva, tristeza, insegurança, para reconhecer aquela emoção, entender o porquê dela, identificar se é possível resolver a situação e pensar estratégias para isso”.

  • 04

    Evite pensamentos negativos

    “Neste contexto de pandemia, somos bombardeados o tempo todo por informações desagradáveis. Então, é preciso evitar esses pensamentos que nos colocam em um estado de desesperança e desamparo, que são um convite ao desespero e à ansiedade. Para isso, não é preciso se alienar, mas é necessário delimitar um momento do dia para receber essas informações e, no restante, fazer alguma atividade que você goste, assistir ou ler coisas leves também vale. Inclua na sua rotina o que te faz bem, aquilo que gera em você emoções positivas.”

  • 05

    Sem desespero, foque no presente

    É preciso aprender a dimensionar as coisas, colocar tudo como um grande problema é um tipo de pensamento extremamente nocivo. É importante também entender a transitoriedade das coisas e manter o foco no que está acontecendo agora. “Quem está sofrendo com a ansiedade precisa repetir para si mesma, como um mantra, que nada é definitivo. Os seus melhores dias não são para sempre, mas os piores também não. Lembre-se de episódios anteriores que você venceu, observe as estratégias que usou. Quando aceitamos a transitoriedade da vida, vivemos mais leve”, orienta.

  • 06

    Cuide da alimentação e do sono

    A ansiedade desregula o apetite, podendo fazer com que o ansioso passe a comer muito ou até mesmo deixe de sentir fome. “Aqui não falo de restrição, falo de variedade de alimentos e do consumo de alguns alimentos que colaboram para a produção de serotonina (neurotransmissor associado às sensações de relaxamento e bem-estar), dentre eles, banana, mel, chocolates meio-amargos e alimentos que contenham vitamina B6”, salienta a psicóloga. A qualidade do sono também é fundamental para o bom funcionamento do corpo, por isso, é importante praticar a chamada higiene do sono: na hora de dormir, desapegar das telas, fazer rituais relaxantes como um banho morno ou uma leitura e observar se seu corpo sente disposição ao acordar, porque isso determina se o sono é de qualidade.

  • 07

    Seja organizado

    A bagunça, é fonte de estresse, se organizar evita uma sobrecarga para a sua mente, quando as coisas estão fora de ordem, ela tende a trabalhar mais para processar uma situação. “Lembrando que cada pessoa se organiza de uma forma diferente, mas o mínimo é manter o espaço que você habita limpo e organizado. Quanto menos informação desnecessária o seu cérebro precisa processar, melhor a qualidade daquilo que realmente importa”, acrescenta a psicóloga.

  • 08

    Opte pelas companhias certas

    Busque a companhia das pessoas que te fazem bem. "Os estudos sobre felicidade mostram que a qualidade das relações é o principal fator promotor de felicidade na vida. Precisamos dar mais importância e atenção às pessoas que já foram conquistadas, em quem já temos segurança. Se aproxime de quem te faz se sentir agradável.”

  • 09

    Dedique tempo a você

    O autocuidado pode diminuir significativamente o nível de estresse que está diretamente ligado à ansiedade. “Tome banhos mais demorados, cuide da sua saúde, relaxe da forma que te faz bem. Nós acabamos negligenciando, mas isso é extremamente importante”, pontua a especialista.

  • 10

    Sorria mais

    Procure lembrar de boas experiências, ver ou assistir imagens que você goste, fazer atividades que te tirem risadas. "Dessa forma, seus neurotransmissores vão gerar emoções positivas que ocasionam sensações físicas agradáveis, como o relaxamento muscular, por exemplo, que ajuda a aliviar a tensão”, finaliza Angelita.

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