A comercialização, importação e publicidade de cigarro eletrônicos – conhecidos também como vapes – é proibida no Brasil. Mesmo assim, o dispositivo, já popular na Europa e nos Estados Unidos, vem ganhando cada vez mais adeptos em nosso país. Ele se apresenta como uma opção moderna, com cheiro menos desagradável do que o tradicional e até promete ajudar no combate ao tabagismo. Porém, por trás dessa cortina de fumaça – ou melhor, de vapor – existem questionamentos e polêmicas a respeito do uso desse cigarro.
A maioria dos cigarros eletrônicos possuem nicotina, droga que leva à dependência química e está presente no cigarro tradicional. A quantidade, no entanto, varia de acordo com a marca do produto. Ele funciona através de um sistema de vaporização. Um líquido presente em um reservatório do cigarro é aquecido por uma resistência e evapora. Ao ser inalada, o vapor leva as substâncias químicas ao sangue do usuário. Além das doenças e irritações respiratórias causadas pela inalação do vapor, os e-cigs podem causar dependência química da nicotina.
O dispositivo se popularizou em locais como Reino Unido e Estados Unidos ao ser apresentado como uma opção menos nociva à saúde. No entanto, essa afirmação não é uma verdade absoluta e é tema de divergências entre especialistas.
No Reino Unido, por exemplo, a Public Health England (PHE), agência do Departamento de Saúde e Assistência Social, entende que os e-cigs são uma boa alternativa para quem pretende parar de fumar e incentiva o uso para pessoas que já consomem o cigarro tradicional.
Já nos Estados Unidos, país que contabilizou mais de 50 mortes no ano passado por doenças ligadas a cigarros eletrônicos, a agência de vigilância sanitária, Food and Drug Administration (FDA), não recomenda o uso do dispositivo neste momento. Eles aguardam estudos mais conclusivos sobre os temas. Afinal, os efeitos dos e-cigs – principalmente os a longo prazo - ainda são desconhecidos. Mesmo com a não recomendação, a comercialização e o uso estão liberados.
Enquanto os efeitos do uso do dispositivo para a saúde ainda são desconhecidos pelos cientistas, cada vez mais jovens começam a consumir e-cigs.
De acordo com Nathália Munck, mestra em psicologia e especialista em tabagismo, as campanhas antitabagismo fizeram o cigarro deixar de ser visto com bons olhos pela população. No entanto, os cigarros eletrônicos passam a imagem de algo moderno e “cool”, o que tem atraído principalmente os mais jovens e pessoas que não consumiam nenhum tipo de cigarro.
“No geral, são os jovens que estão consumindo mais. Nos Estados Unidos, muitos começam ainda no High School [equivale ao ensino médio no Brasil}. Que são bem jovens mesmo, até menor de idade. Então essa é uma preocupação em relação à política do tabagismo no geral. Não só as pessoas têm trocado o cigarro tradicional pelo cigarro eletrônico, mas muitas pessoas que não usavam nenhuma forma de tabaco têm começado a usar o cigarro eletrônico”, avalia Nathália.
A abordagem que os órgãos regulatórios adotam em relação ao cigarro eletrônico também pode influenciar no consumo do dispositivo pela população. Na pesquisa de mestrado da psicóloga, desenvolvida pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e Univesity of Kansas Medical Center (EUA), a psicóloga avaliou como a comunicação dos governos influenciavam no consumo de cigarros eletrônicos. No Reino Unido, onde o governo tem uma abordagem mais positiva dos e-cigs, 78,4% dos usuários que querem parar de consumir os cigarros eletrônicos planejam parar após um ano ou mais. Já nos EUA, 58,9% pretendem levar todo esse tempo antes de abandonar os e-cigs.
No Brasil, a regulamentação dos e-cigs começou a ser discutida pela Anvisa ainda em 2019. Nathália, no entanto, se diz preocupada com as medidas que serão determinadas pelo órgão. Ela reforça que o Brasil é exemplo no combate ao tabagismo para todo mundo e que, neste momento, é necessário conhecer as consequências dos cigarros eletrônicos antes de liberar a comercialização.
No entanto, nem todos estão contentes com a proibição. Alexandro Lucian, jornalista que atualmente possui um site especializado em reduções de danos do tabaco, acredita que a proibição acaba prejudicando consumidores, pessoas que poderiam deixar o cigarro tradicional e aderir os e-cigs e a fiscalização.
“Na verdade, a proibição é a pior das opções que o Brasil tem, porque quando é proibido não é fiscalizado. A proibição já não adianta mais, já que nós temos um comércio de cigarros eletrônicos no Brasil ilegal, e muito grande. Muitas vezes você tem vendedores que vendem para menores e vendem produtos falsificados. Ou seja, quando você proíbe, você não fiscaliza, né?”, comenta Alexandro.
O jornalista acredita que o Brasil deve seguir exemplos de países como a Inglaterra, onde ele acredita que a fiscalização é mais intensa, não deixando o e-cigs chegar nas mãos de quem não deveria. No caso, menores de idade e pessoas que não fumavam anteriormente. Ele comenta que, a partir de uma experiência própria, começou a se aprofundar no assunto.
“Eu fumei por 15 anos, fumava três carteiras de cigarro todos os dias. Usei adesivo, goma de mascar, remédio, acupuntura, tive apoio psicológico. Tive força de vontade várias vezes, e não consegui durante todo esse período. Até que quando eu peguei o meu primeiro cigarro eletrônico, eu parei de fumar da noite para o dia e nunca mais voltei”, afirma Alexandro.
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