Lavar as mãos sempre foi um hábito importante. Mas é fato que a pandemia de coronavírus nos impôs uma série de novos rituais de higiene. Tem gente levando isso bem a sério. Até demais. Afinal, o excesso de limpeza pode virar um problema?
A professora de Microbiologia Clarisse Arpine lembra que a melhor recomendação para se prevenir da Covid-19 continua sendo caprichar na higiene. Certos cuidados, no entanto, podem acabar o efeito oposto do desejado, ou seja, prejudicar a saúde.
Clarisse cita o caso dos sabonetes antimicrobianos, que existem aos montes nas prateleiras das farmácias e supermercados e estampam, em suas embalagens, a atrativa promessa de matar até 99% das bactérias. Aí é que mora o problema.
Nosso corpo é coberto por diversos micro-organismos que formam uma barreira primária contra doenças, como soldados na linha de frente no momento que tivemos o contato com algo nocivo. Só que produtos como esses, os antimicrobianos, não são seletivos. Eles não vão eliminar apenas os micro-organismos que são nocivos, explica ela.
Nem toda sujeira é capaz de adoecer, segundo a professora. Quando a criança está brincando na terra, por exemplo. Aqueles micro-organismos na mão dela vão impedir que bactérias que possam ser patogênicas se instalem sobre a pele dela e comecem a causar doença. Se você tem micro-organismos que são benéficos para sua saúde ali na sua pele, quando você entrar em contato com algo patogênico isso vai ter dificuldade de se instalar.
Mas ao usar de forma exagerada produtos com finalidade antisséptica, a pessoa pode estar simplesmente abrindo caminho para as enfermidades. Os antissépticos podem destruir a microbiota normal, que é a primeira linha de defesa da gente, observa Clarisse.
Isso é comum de acontecer, sobretudo, entre profissionais da saúde, que utilizam de maneira mais frequente produtos com ação antibactericida.
Vemos nesses profissionais um aumento de uma microbiota não desejada na pele, causando processos alérgicos, até infecções. Mas são pessoas que precisam ter essa medida. O problema é que pessoas que não são da área da saúde fazem esse uso em excesso porque não têm orientação. Acham que estão trazendo benefícios para si próprias, para seus filhos, só que muitas vezes estão se prejudicando, destaca a especialista.
O recado da professora é: para manter uma higiene adequada, o sabonete comum faz a tarefa muito bem. Claro que a gente passando por esse problema de pandemia não tem como criticar essas pessoas que estão buscando esses produtos, porque elas têm medo de adoecer. Mas o ideal mesmo é água e sabão.
O mesmo raciocínio vale para a higiene íntima, que pode ser feita com água e sabonete comum em vez dos chamados sabonetes íntimos.
E usar o álcool em gel de forma exagerada? Poderia causar uma resistência bacteriana?
Não há nenhum histórico disso até hoje. Mas já se sabe que há bactérias resistentes ao álcool em gel porque, em algum momento, houve um exagero no consumo de antibióticos ou de produtos antibacterianos, pondera.
E quando a limpeza vira mania mesmo? A psiquiatra Letícia Mameri diz que o medo do coronavírus pode estar levando algumas pessoas a desenvolverem até certos transtornos psíquicos.
Com o aumento do estresse e ansiedade das pessoas é esperado uma piora dos quadros ansiosos, inclusive o TOC, o Transtorno Obsessivo Compulsivo, em pessoas que já possuem o diagnóstico, assim como a abertura de quadros em pessoas que antes não tinham sintomas.
No TOC, a pessoa acha que nada está suficientemente limpo. Ela tem uma preocupação de desinfetar objetos o tempo todo, lavar as mãos repetidas vezes seguidas, a ponto até de ferir a própria pele.
Em uma época de vigilância em relação aos hábitos de higiene para evitar a contaminação por coronavírus, esses sintomas podem ser confundidos com zelo ou passarem despercebidos, de acordo com a médica. Por isso é essencial a avaliação por médico especialista. É um quadro complicado de condução, grave, que causa muito sofrimento e de difícil tratamento.Mas com evolução boa quando tratado adequadamente, afirma Letícia.
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