Você dorme bem? Hoje em dia, uma boa noite de sono parece que virou artigo de luxo. A ponto de estarmos vivendo o que alguns chamam de epidemia do sono insuficiente. É só olhar para o lado e você vai encontrar facilmente alguém que só consegue pregar os olhos depois de umas gotinhas disso ou de uma pílula daquilo.
Não é pouca gente. Segundo a Associação Brasileira do Sono, 75% da população têm problemas com esse hábito natural e essencial e outros 60% admitem que dormem menos de sete horas por noite.
Por que, afinal, dormir virou um privilégio? Uma das explicações: nos dias de hoje, nós, mortais, temos a terrível sensação de que enquanto dormimos, estamos deixando de fazer várias outras coisas: estudar, ler, ver série, dar uma olhada nas redes sociais, limpar a casa ou trabalhar mais um pouco para pagar os boletos e tal.
O fato é que paramos de valorizar o sono, como observa a psicóloga Helena Lorencini. O sono reparador, antes visto como indicador de qualidade de vida, passou a ser considerado por muitas pessoas como perda de tempo ou um luxo para ser usufruído na velhice, comenta.
Só que esse descanso não é algo que podemos deixar para a eternidade. O sono é uma função biológica e é uma das necessidades primordiais do ser humano, tão importante quanto se alimentar de forma nutritiva. Após um dia de atividades, o sono tem papel fundamental de relaxar e reestabelecer o organismo para um novo ciclo de atividades, explica a psicóloga.
A pneumologista e especialista em Medicina do Sono Simone Prezotti destaca que são vários os fatores que podem levar alguém a dormir mal. Isso tem relação com estresse, ansiedade, depressão, com um estilo de vida pouco saudável, com irregularidades no horário de dormir, com sedentarismo Mas também tem uma relação muito importante com o uso de eletrônicos, como tablet, celular, computador. Essa luminosidade que surgiu de uns anos para cá piorou o sono das pessoas, aponta.
Vivemos hiperestimulados. Levamos para a cama os problemas e o celular. O corpo sente. E o sono vai embora. A questão é que a luz que vem dos dispositivos inibe a produção de melatonina, avisa Simone.
A melatonina, aliás, é uma velha conhecida dos insones. Há quem faça uso dela, porém, sem saber direito para o que ela serve. Outros apelam para outros recursos mais pesados. Na rotina agitada, precisam de algo que os apague quando a noite chega. Segundo a pneumologista, os brasileiros compraram mais de 56 milhões de caixas de remédios para dormir só em 2018. Entre os campeões estão o clonazepam, o alprazolam, o zolpidem.
Ocasionalmente, a gente precisa desses medicamentos. Mas muitas pessoas acabam tomando com uma frequência maior e passam a precisar sempre deles para dormir. Alguns alteram a qualidade do sono. Fazem a pessoa dormir, mas o sono é artificial, é leve, fragmentado. E têm efeitos colaterais, a longo prazo não faz bem para memória, por exemplo, cita ela.
Já se deu conta de como uma noite maldormida acaba com seu dia? Quem dera o estrago fosse só esse! Estudos que mostram que dormir pouco é a maneira mais fácil de morrer cedo. O sono é um termômetro de saúde, afirma o neurologista e professor de geriatria da Emescam, Hebert Cabral. A pessoa malha, corre, tem emprego, mas não dorme. Então, ela não está bem de saúde.
A ausência de um sono reparador, diz o médico, é extremamente danosa para o organismo. A primeira consequência são alterações no sistema cardiovascular. A pessoa fica mais propensa a ter hipertensão e as repercussões disso, com danos em vários órgãos no corpo. No dia posterior a uma noite maldormida ela já fica mais taquicárdica, inquieta, cita Cabral.
Sem descansar, o sujeito tem sua capacidade de atenção afetada e, assim, tem mais chance de sofrer acidentes. Não se deve tomar decisões importantes no dia posterior a uma noite maldormida, frisa.
De acordo com o médico Wesley Schunk, uma única noite sem dormir pode aumentar em até 30% os níveis de ansiedade. Com o tempo, pode haver ganho de peso. A melatonina é um hormônio natural que tem sua produção acelerada quando dormimos. E ele não só reduz o apetite como também combate enxaqueca, melhora a pele, controla a glicemia e inibe as células de gordura do corpo humano, evitando quadros de obesidade.
Segundo Schunk, também é durante o sono que aumentamos a produção da leptina, hormônio que controla a sensação de saciedade. Dormindo pouco, a produção desse hormônio fica comprometida e a sensação de saciedade demora a chegar. Além disso, a grelina, hormônio que controla a fome, aumenta, fazendo com que haja um maior consumo de alimentos do dia seguinte, auxiliando no ganho de peso.
Mas, afinal, o que é ter um sono bom? Segundo Cabral, a gente sabe se teve uma boa noite de sono se acordou no dia seguinte se sentindo bem e descansada, quando o despertador tocou de manhã.
É minha fantasia na cama, brinca o servidor público estadual Augusto Valle, 49 anos, que não se lembra de ter tido, nos últimos dez anos, uma noite de pleno descanso. Consigo até dormir com certa facilidade. Mas não é um sono que me revigora. Sinto que estou sempre com déficit de sono, conta ele.
Eventualmente, Augusto precisa recorrer a remédio. Tomo 1mg e resolve. Mas tento evitar ao máximo porque sei das implicações do uso contínuo. Ele prefere adotar outras estratégias mais naturais. Evito açúcar e alimentação pesada que possa atrapalhar minha digestão à noite. E passei a beber chá antes de ir dormir. Nunca gostei de chá, mas aprendi a tomar isso porque noto uma melhora significativa. Tem que ajudado muito, revela o servidor, que adotou um blend relaxante que reúne oito ingredientes.
Para a especialista em sono Simone Prezotti, não é preciso sonhar em ter uma noite perfeita sempre. É normal, às vezes, dormir tarde e perder algumas horas de sono. É normal, às vezes, acordar para ir ao banheiro de noite. Tem gente que fica superexigente com o sono, não quer acordar nenhuma vez. Isso vira um estresse também. Dormir é uma coisa boa, natural, que precisamos fazer sem uso de nenhum artifício.
Mas e aí, tem como dormir melhor? Tem. Na próxima página, os especialistas ouvidos nesta matéria dão dicas de como você pode acertar os ponteiros de vez com seu sono. Dá uma lida lá e bom descanso!
Nos últimos oito anos, dormir se tornou um pesadelo para a servidora pública federal Denise da Silva Lemos, 40 anos. Na verdade, ela simplesmente não dormia.
Ter dois filhos pequenos contribuía bastante para isso. Mas as crianças, hoje com 4 e 8 anos, foram crescendo, e ela continuava extremamente cansada. Estava sempre mal humorada, desanimada. Era como se nada estivesse bom. Lugar nenhum era interessante, nada me agradava, conta Denise.
Ela se olhava no espelho e não se reconhecia com 22 quilos a mais e profundas olheiras. Decidiu que precisava mudar. Precisava dormir. Eu estava acabada. Mas não dava para culpar as crianças. Eu estava sedentária, com uma péssima qualidade de vida.
Denise foi buscar ajuda. E não de remédios. Disse chega, preciso olhar para mim!. Procurei a terapia e comecei dieta e exercício. Está tudo interligado: corpo e mente, relata a servidora, mãe do Miguel e da caçula, a Helena.
Começou a dançar forró, fazer musculação e praticar corrida. Passou a se alimentar melhor. Emagreceu. E o sono, claro, melhorou. Em oito meses, minha qualidade de sono mudou consideravelmente. Nem tenho mais enxaqueca que tinha pela falta de sono. Acordo sem despertador. E olha que antes ele tinha que tocar bastante!.
Quando passou a dormir bem, Denise viu tudo ficar mais belo. É engraçado até. Outro dia, no meu local de trabalho, uma pessoa perguntou se eu era nova lá, onde estou há 10 anos! É porque eu vivia de cara amarrada, chegava infeliz, era invisível. Agora estou em outro momento da minha vida!.
Com uma rotina pra lá de agitada e mil coisas para fazer, a empresária Letícia Modenese, 45 anos, precisa ser organizada e cumprir certos rituais. Inclusive na hora de dormir. Ela não lembra direito como chegou até a pílula do sono, mas tem feito uso dela há quase dez anos. Minha vida é dividida em antes e depois da melatonina, relata.
A melatonina é um hormônio produzido por uma glândula no nosso cérebro e liberado com o fim do dia, preparando o corpo para o período noturno. Já nas farmácias fora do país (a melatonina não é vendida no Brasil), ela pode ser encontrada em forma de comprimido mastigável, cápsula, gota ou spray nasal. A indicação é médica.
A gente produz a melatonina mais ou menos duas horas depois que escurece. Ela fica no seu pico mais alto de madrugada, por volta de 2h. Depois o nível vai caindo, explica a pneumologista e especialista em medicina do sono Simone Prezotti.
Só que as pessoas não estão deixando que essa fábrica interna faça seu trabalho. Anoiteceu, é para dormir. O ideal é deixar corpo liberar a melatonina naturalmente. Mas as pessoas levam o celular para a cama, inibindo a produção dessa substância, comenta a médica.
Para não seguir noite adentro com os olhos arregalados, tem gente apelando para esse hormônio. Ela tem suas indicações, como para idosos, que já não produzem tanta melatonina, ou para pessoas que trabalham em turno noturno e precisam dormir de dia. Mas não é para tratar insônia, por exemplo. Ela aumenta o tempo de sono em poucos minutos, melhorando o início do sono discretamente, diz Simone. E tem efeitos colaterais: Pode dar dor de cabeça, mal-estar gastrointestinal. Cerca de 10% das pessoas que tomam melatonina têm algum efeito colateral. Não se sabe o efeito disso a longo prazo e nem em crianças.
Letícia se diz fã e só vê vantagens. Em meia hora, estou dormindo igual um neném. Ela faz estoque de melatonina em casa, com medo de ficar sem. Sempre dormi bem, só que muito tarde. E aí, acordava tarde no dia seguinte. Isso me atrapalhava muito. Sono é importante demais! Foi quando me falaram da melatonina. Passei a programar meu sono. E agora durmo seis, sete horas de sono profundo e acordo às 5h revitalizada, bem disposta, levo os filhos à escola, vou malhar e depois trabalhar. Melhorou pele, cabelo, humor, tudo!, comenta a empresária, que chama a balinha de elixir da juventude.
Tenha horários regulares para dormir e para acordar. O corpo gosta de rotina, inclusive nos finais de semana
Reduza o consumo de cafeína ou qualquer estimulante a partir do final da tarde. Reduza ou retire totalmente álcool, nicotina ou ingestão excessiva de líquidos à noite
Evite alimentos ricos em açúcar à noite e coma algo leve após às 20h. Chás como de capim cidreira, maracujá, lavanda e camomila ajudam a deixar o sono chegar
Prefira fazer atividade física até seis horas antes de se deitar. Evite exercício à noite próximo da hora de ir dormir
Em vez de se medicar, que tal meditar? A prática ajuda a colocar os pensamentos em ordem, a acalmar, além de relaxar os músculos
Ao chegar em casa tente se desconectar do trabalho, dos compromissos, responsabilidades e do mundo virtual. Use o tempo para desacelerar. Tome um banho morno
Se for ver uma série à noite, prefira a TV ao tablet, pois este emite luz azul que atrapalha o sono. E estipule um número determinado de episódios para não varar a madrugada
A temperatura ideal para dormir fica em torno de 23 graus. O corpo precisa esfriar para relaxar. O ambiente todo tem que ser confortável: limpo, escuro e sem ruídos
Não pegue calmantes e soníferos com amigos e parentes. Cada medicamento tem função e dose específicos. Se tem problemas de sono, consulte um médico
Tenha sempre um caderno de anotações onde você deve registrar pensamentos e preocupações com as demandas do cotidiano; isso te ajudará a não ter ruminações de pensamentos próximo da hora de dormir
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