Por volta das 9 horas de um sábado, Adriano Moreira de Souza, de 46 anos, está junto a outra seis pessoas numa casa em Vitória que tem paredes pintadas de rosa. Sentado numa cadeira de madeira, ele tem uma experiência única com uma uva-passa. Olha para a fruta, coloca-a na palma da mão para perceber como é enrugada, cheira e, só então, põe na boca e vai mastigando de forma lenta. Como uva-passa com frequência e nunca tinha parado para perceber todos esses detalhes. São coisas simples que, com a pressa do dia a dia, a gente não repara, diz o servidor público federal.
A experiência da uva-passa foi, na verdade, apenas um dos exercícios com o objetivo de usar os sentidos do corpo de um curso de Mindfulness. Nascido em prestigiosas universidades dos Estados Unidos e da Europa, o Mindfulness, chamado também de consciência ou atenção plena, está causando uma revolução no jeito de meditar. Por meio de exercícios de respiração e concentração, a técnica ajuda a combater os males da nossa época de uma forma simples e pode ser adotada em todas as ações do cotidiano. Além disso, pesquisadores confirmam seus efeitos positivos à saúde.
O objetivo é encontrar um estado de presença consciente e intencional no aqui agora. É trazer para a consciência o estado de nossas emoções, pensamentos e sensações de nosso corpo sem julgamentos ou pré-conceitos, simplesmente observando o que acontece em nosso interior e ao nosso redor. Sob a forma de meditação, a atenção plena atua como ótima aliada ao aumento da produtividade e foco e está se tornando cada vez mais difundida, sendo praticada por um público que vai dos grandes executivos às crianças, explica Vivian Wolff, facilitadora de Mindfulness.
Grandes empresas e celebridades também já aderiram à técnica. Na sede do Google, na Califórnia, os funcionários a praticam desde 2007, por iniciativa do engenheiro Chade-Meng Tan. Ele estruturou um programa de Mindfulness chamado Search Inside Yourself. Os ganhos são redução de estresse, melhor relacionamento no trabalho e desenvolvimento de habilidades importantes, como liderança.
Foi há dois anos que Adriano ouviu falar, pela primeira vez, nesse tipo de meditação. Conciliando a jornada de sete horas diárias de trabalho com o mestrado, era preciso desacelerar e, principalmente, ter foco. A vida é corrida e eu ficava muito ansioso pensando nas coisas do futuro. Focava em antecipar as ações e não vivia o presente. A meditação me ajudou a viver o agora, conta.
Ele costuma praticar a meditação em casa, durante cerca de 20 minutos, sempre pela manhã, assim que acorda. Não é nada mágico, é preciso prática. Hoje, quando percebo que estou muito ansioso, sei o motivo: estou há dias sem praticar. A meditação me traz tranquilidade, serenidade paz e concentração. É um hábito que adquiri e me faz muito bem, conta Adriano, explicando que os grandes meditadores dizem que é, antes de tudo, um exercício de grande recomeço. Também estou sempre recomeçando.
Estar presente
Ter uma vida mindful é se relacionar de forma mais consciente com a própria atividade mental, e, assim, evitar estresse desnecessário e aumentar a sensação de bem-estar. Mindfulness é uma ferramenta poderosa para apreciar as experiências que vivemos, mesmo quando não são da forma como gostaríamos. Ele tem como objetivo estimular o cérebro a perceber os movimentos do corpo e as sensações em qualquer situação.
As pesquisas sobre Mindfulness começaram em 1979, na Universidade de Massachussets, nos Estados Unidos. O médico Jon Kabat-Zinn desenvolveu um programa para reduzir o estresse baseado na prática. O método também foi estudado na Universidade de Oxford, na Inglaterra. Conforme os estudos avançavam, os especialistas percebiam que esse tipo de meditação, que surgiu no meio acadêmico e era desvinculado de qualquer religião, conseguia reduzir os níveis de estresse e ansiedade dos pacientes. O segredo era colocar na rotina práticas diárias para exercitar o estar presente.
Foi em busca do estar presente que o russo Denis Karenkin buscou primeiro a Yoga e depois o Mindfulness para a sua vida, quando a técnica nem era tão falada por aqui. Ele se mudou para os Estados Unidos no fim dos anos 1990. Começou a praticar Yoga em Nova York em 2003 e, em 2009, formou-se como professor de Kundalini Yoga e Meditação pelo Kundalini Research Institute. Deu aulas em Nova York e Nova Jersey, antes de se mudar para Vitória em 2011, onde vive atualmente. Trabalhei num banco em Nova York e depois numa empresa de comércio internacional, era uma vida muito corrida. E na época começaram a surgir os questionamentos se aquele era o emprego ideal ou se aquela era a vida que eu queria, conta.
Silêncio
Denis pratica e estuda meditação Mindfulness desde que participou do seu primeiro retiro de silêncio, chamado de Vipássana, no município de Miguel Pereira, no Rio de Janeiro. Foram dez dias sem falar, ler ou escrever, mais de uma centena de horas imóvel. O objetivo do curso era mudar o funcionamento da mente para eliminar o sofrimento. No retiro, você deixa todos os objetos valiosos na recepção, principalmente o celular. Foi uma experiência muito forte em silêncio absoluto numa sala enorme. Quando a gente olha para dentro, nem sempre é muito bom, porque criamos certas atitudes. Aprendi que uma delas é não se julgar.
Denis, que é professor de meditação na cidade, explica que Mindfulness desenvolve, através de técnicas, o que a pessoa tem hoje. E trabalha isso através de aceitação e não do julgamento. Estamos completamente perdidos nos pensamentos. O mundo moderno nos incentiva a viver no futuro ou no mundo da fantasia. De alguma maneira chegamos a acreditar que, o que está acontecendo agora, não é suficiente, explica. Para ele, esse é um caminho sem volta. Acredito que, daqui a menos de 50 anos, a meditação vai entrar na vida das pessoas como o exercício físico é hoje. Mais importante do que cuidar do corpo, será cuidar da mente.
Concentração
Vivian Wolff, Coach de Vida e Carreira e Facilitadora de Mindfulness, explica que na prática da meditação é mais importante a frequência do que o tempo diário dedicado a ela. É como um músculo que você está trabalhando, não entramos em forma levantando muitos quilos em apenas um dia. É a constância do exercício que vai nos trazer seus benefícios. É importante conseguir realizá-la diariamente ou, no começo, com a maior frequência possível, diz.
Ela explica ainda que a prática básica do Mindfulness tem como princípio o prestar atenção em nossa respiração e evitar assim se deixar levar pelos pensamentos. Por ser uma técnica muito simples, é possível realizá-la em qualquer ambiente, desde que você consiga estar em um momento tranquilo, sem interrupções ou algo que possa te atrapalhar.
É em casa ou no parque do bairro que a universitária Carolina Pretti, 18 anos, costuma praticar Mindfulness. A inspiração para a meditação ela aprendeu em casa, já que a mãe é praticante de Yoga. O período do pré-vestibular foi um momento de muita ansiedade. Foi nesse período que recebi um email do curso de Mindfulness e resolvi participar. Não parei mais, conta.
A jovem, que tenta praticar pelo menos 10 minutos diariamente, conta que entre os benefícios estão o foco e a melhora da respiração, contribuindo inclusive na melhora de outras atividades do dia a dia. Para conseguir meditar tem que ter paciência consigo. Com Mindfulness aprendi a escutar.
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