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Pandemia: como o isolamento social impacta a vida das crianças

Pandemia: como o isolamento social impacta a vida das crianças

Sono alterado, emoções à flor da pele, ensino à distância... Psicanalista explicam como a quarentena está refletindo na forma que as crianças se comportam neste período de pandemia

Publicado em 3 de julho de 2020 às 17:44

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Crianças de máscara olhando pela janela de casa: quarentena
É preciso validar as emoções das crianças, principalmente neste período de isolamento social. E acolher, acolher e conhecer o pequeno. (L.Julia/Shutterstock)

Assim como os adultos, os pequenos tiveram que se adaptar de uma hora pra outra a uma nova realidade. Escolas fechadas, amiguinhos longes, brincadeiras nos parquinhos suspensas e, pra completar, todos trancafiados em casa sob a ameaça de um inimigo invisível. Enfrentar o período de isolamento social não tem sido fácil pra ninguém. Mas é preciso uma atenção especial às crianças.

Um levantamento realizado na província chinesa de Xianxim com 320 crianças e adolescentes revela os efeitos psicológicos mais imediatos da pandemia: dependência excessiva dos pais (36% dos avaliados), desatenção (32%), preocupação (29%), problemas de sono (21%), falta de apetite (18%), pesadelos (14%) e desconforto e agitação (13%). A pergunta que fica é: como o isolamento impacta a saúde das crianças?

A psicanalista Bianca Martins explica que todas as crianças no mundo, independente da idade, estão sendo impactadas pelo isolamento. "Um bebê muito pequeno é impactado pelas ansiedades e angústias de seus pais. Uma criança na primeira infância está impactada pois perdeu o acesso aos seus cuidadores secundários (babá, avós, tios e primos), as crianças com mais de 5 anos são impactadas pela ausência de trânsito social com seus iguais, ou seja, os amigos da escola e esses impactos são acumulativos, desde as questões dos pais, o isolamento da comunidade, a impossibilidade de estar com os amigos, e desfrutar as experiências coletivas", diz a colunista da Revista.ag.

A psicanalista Renata Tavares Imperial acrescenta que desde muito pequena, ainda bebê, a criança consegue expressar que está vivenciando algum tipo de sofrimento. "Em cada fase da vida, a criança vai expressar de formas diferentes. Alguns sinais são mais comuns em diferentes fases da infância, como o choro intenso, a irritabilidade, as alterações no padrão de sono e de alimentação... Uma criança a partir dos quatro anos já consegue expressar que está com medo. As que estão no ensino fundamental podem demonstrar que estão angustiadas, estressadas e ansiosas por meio de sua relação com as atividades escolares (dificuldades de aprendizagem, de concentração e diminuição do rendimento escolar). Alguns chegam a falar de sensação de morte e de solidão", alerta.

De acordo com a psicanalista, o estresse e a ansiedade podem ser nomeados como manifestações de sofrimento, como sinais de que algo não vai bem na vida da criança. "E podem ser desencadeados por inúmeros fatores, como por exemplo os processos de perda que estamos vivenciando com a quarentena. A perda de uma rotina escolar e de atividades extras, perda da convivência com outras crianças e com familiares, perda da liberdade de frequentar espaços públicos e de lazer, perda da sensação de segurança e de estabilidade de alguns pontos de sua vida".

Seja próximo

Não se deve menosprezar a presença da ansiedade e da depressão na infância. Os adultos devem dar valor e escutar as manifestações delas, evitando diminuir e achar que elas têm menos importância por ser coisa de criança. "Existe adoecimento psíquico em crianças, infelizmente é uma realidade. Para alguns adultos, é quase insuportável lidar com o sofrimento na infância, o que pode gerar uma resposta de negar. Se o adulto nega o sofrimento da criança, esse processo se torna ainda mais difícil e penoso, pois a criança depende do adulto na resolução dos seus problemas. A recomendação que vale para os pais é que escutem e conheçam seus filhos. Estejam acessíveis, a criança precisa saber com quem pode contar", sugere Renata Tavares Imperial.

Aspas de citação

Para alguns adultos, é quase insuportável lidar com o sofrimento na infância, o que pode gerar uma resposta de negar. Se o adulto nega o sofrimento da criança, esse processo se torna ainda mais difícil e penoso, pois a criança depende do adulto na resolução dos seus problemas. A recomendação que vale para os pais é que escutem e conheçam seus filhos. Estejam acessíveis, a criança precisa saber com quem pode contar

Renata Tavares Imperial
psicanalista
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Bianca Martins concorda, dizendo que os adultos possuem o hábito equivocado de acreditar que as crianças não têm motivos para sofrer emocionalmente, já que não têm trabalho e não entendem o mundo. "Justamente por esse motivo que as crianças adoecem emocionalmente. É função do adulto 'alfabetizar emocionalmente' a criança para que ela reconheça suas emoções, lide com suas frustrações e saiba como encontrar modos de lidar com seus conflitos. Validar as emoções da criança, e pedir a ela que dê ideias de modos para enfrentar a situação, faz com que a criança se sinta considerada e respeitada. Faz com que ela se sinta pertencente à família. As crianças são naturalmente solidárias e quando os adultos escutam suas vozes, atenuam suas ansiedades e constituem sua confiança em si e sua autoestima". 

O impacto psicológico da pandemia depende da reação dos adultos em casa. Por isso, os pais devem dar o exemplo no controle do estresse e da rotina. "Aprendemos por imitação. O modo como o papai e a mamãe lidam com o estresse são fundamentais, pois isso inclui o modo como eles lidam com o estresse. Não cabe fingir. É muito comum que exijamos dos pais um controle excessivo sobre suas emoções. É fundamental que eles possam dizer às crianças que também estão chegando aos seus limites e que contam com a ajuda delas para que o ambiente fique mais confortável emocionalmente para todos. É muito importante pactuar com as crianças", diz Bianca Martins.

Atenção a alguns sinais:

Falta de apetite

A ansiedade pode incidir na vida de uma criança provocando alterações no padrão de alimentação, tanto no aumento quanto na diminuição do apetite. "Antes de qualquer ação dos pais frente a essa questão, é fundamental que os pais entendam que a mudança no apetite pode ser um sinal de incômodo, angústia da criança, e isso precisa ser escutado como tal. Não adianta apenas os pais quererem corrigir o que está fugindo de um certo padrão, o mais importante é acolher e tentar entender o que está se passando. Na maioria das vezes, quando os pais acolhem primeiro, depois eles conseguem fazer as adequações necessárias, que passam a ser mais efetivas e duradouras", diz Renata Tavares Imperial.

Sono

E as crianças que estão com dificuldade para manter sono? "Reduza os eletrônicos. Esse é o pior inimigo do sono das crianças no momento. Para dormir é necessário nos permitir desligar. E as crianças, devido à ansiedade, estão consumido os gadgets em excesso, o que podemos chamar de intoxicações eletrônicas. Menos telas e mais livros. Para todas as idades. Estabelecer uma rotina minimamente estruturada e acessível à criança também ajuda muito pois ela terá algum controle sobre como 'gastará' seus dias. Lembrando que cabe à criança alguns deveres no ambiente familiar. Cuidar de seu quarto, seus brinquedos, suas atividades da escola, brincar com os bichos de estimação... São atributos da infância e fazem muito bem para a saúde mental dos pequenos", diz Bianca Martins

Emoções

Os pais devem dar o exemplo no controle do estresse e da rotina, explicar a situação aos filhos com honestidade, tranquilizá-los em momentos tensos. 

Ansiedade

A criança se torna mais reativa, menos tolerante, desestabiliza-se emocionalmente com mais facilidade. Requer mais atenção do que o habitual, frequentemente está insatisfeita, pode apresentar-se excessivamente perfeccionista. Quando maiores, não conseguem se concentrar em um atividade pelo tempo esperado para sua idade. "Nesses momentos é urgente que paremos para prestar atenção às reais necessidades das crianças. Pisar no freio e recalcular as demandas direcionadas à criança é uma boa estratégia. Fazer um picnic no carro, uma videochamada com os avós, ou ir dar uma volta na praia para que a criança possa correr livremente. É importante conversar, acolher e buscar ajuda especializada quando a situação extrapolar a capacidade de manejo dos pais", diz Bianca martins

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