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Pobreza menstrual: saiba como o problema afeta a saúde das mulheres

Pobreza menstrual: saiba como o problema afeta a saúde das mulheres

A dificuldade de acesso às condições básicas de higiene afeta mulheres no Brasil e no mundo. A data, reconhecida pela ONU, traz visibilidade para a temática da menstruação, que antes era considerada um tabu

Publicado em 28 de maio de 2021 às 14:48

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Menina segurando um absorvente
É o dia voltado para a conscientização da importância dos cuidados e da mobilização pelo direito de acesso a produtos básicos como absorventes. (Freepik)
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Logomarca Todaselas. (A Gazeta)

Você já ouviu falar em pobreza menstrual? O termo se refere a um fenômeno mundial que está relacionado à falta de recursos de meninas e mulheres para manter uma boa higiene no período da menstruação, seja por falta de dinheiro, infraestrutura ou saneamento básico. 

No Brasil, cerca de 713 mil meninas vivem em casas sem banheiros e mais de 4 milhões não têm acesso a itens mínimos de cuidados menstruais nas escolas, segundo o relatório "Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos", lançado pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Isso sem falar na crescente população de rua e de vulneráveis do País.

Os resultados demonstrados no relatório, de acordo com o UNFPA, demonstram negligência por parte do Estado e falta de garantia de direitos em boa parte do país. Mas não se trata de um problema apenas de países em desenvolvimento, apesar das condições socioeconômicas terem, obviamente, um impacto expressivo na questão.

Em vários países, inclusive os mais ricos, como Estados Unidos, os números de falta à escola também impressionam. Dados da Organização Mundial da Saúde (ONU) revelam que, em todo o mundo, uma em cada 10 meninas deixam de ir ao colégio durante o período menstrual, por questões relacionadas à falta de acesso ao básico, por medo, vergonha ou pela combinação desses fatores.

Por tudo isso, o dia 28 de maio passou a ser considerado o Dia Internacional da Higiene Menstrual, voltado para a conscientização da importância dos cuidados e da mobilização pelo direito de acesso a produtos básicos como absorventes. “A menstruação é algo natural, fisiológico, uma parte da vida da mulher, mas infelizmente ainda vive cercada de tabus. Soma-se a isso o fato de que muitas adolescentes e mulheres no mundo não têm acesso nem à água tratada, que dirá a absorventes ou coletores menstruais. E isso pode trazer consequências para a saúde da mulher, do ponto de vista emocional e físico”, explica o ginecologista e obstetra Remegildo Gava. 

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A menstruação é algo natural, fisiológico, uma parte da vida da mulher, mas infelizmente ainda vive cercada de tabus

Remegildo Gava
Ginecologista e obstetra
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Para ele, o acesso a produtos sanitários e a espaços seguros e higiênicos é um ponto importante para lidar com a menstruação sem vergonha ou estigma. E é fundamental que a mulher em todas as suas demandas e faixas etárias tenha uma atendimento digno. “Da menarca – que é a primeira menstruação – passando para uma possível decisão de querer engravidar ou de evitar uma gravidez até o período da menopausa, essa assistência é importante e garante uma vida mais saudável e equilibrada”, diz.

MATERIAIS IMPRÓPRIOS

A ginecologista e obstetra Anna Carolina Bimbato conta que adolescentes e mulheres que não têm acesso à água tratada, a absorventes ou coletores menstruais, acabam usando o que possuem por perto no período menstrual. "Pode ser trapos de pano, papel e até reutilizar absorventes descartáveis. Com isso as infecções urinárias e genitais se tornam frequentes. Pela falta de absorventes, muitas meninas deixam de frequentar a escola o que pode ser devastador para o desenvolvimento".

médica obstetra Anna Carolina Bimbato
A ginecologista Anna Carolina Bimbato fala da importância das mulheres terem acesos a absorventes ou coletores menstruais. (Arquivo pessoal )

"Segundo pesquisas, mulheres com infecções urogenitais tinham duas vezes mais chances de usar panos reutilizáveis ​​em vez de absorventes higiênicos descartáveis. Algumas também inserem jornal em suas vaginas para reduzir a chance de vazamento menstrual, apesar da preocupação de que isso possa não ser seguro e que a tinta do jornal possa causar câncer", completa o ginecologista Fábio Kuteken, da Rede de Hospitais São Camilo, de São Paulo.

ALTO CUSTO

Mariana Betioli, obstetriz e fundadora da marca de coletores menstruais Inciclo, defende que a menstruação deve ser discutida por todos os setores da sociedade. “A data é muito pertinente para fazer com que se pense em ações para alcançar um ambiente mais justo no que diz respeito às questões de gênero”, aponta. “Por isso, além de termos o Dia Internacional da Higiene Menstrual, todo o mês de maio é voltado para trazer à tona a visibilidade do ciclo menstrual”.

Em média, as mulheres gastam quase nove mil reais em absorventes descartáveis ao longo da vida, o que dá, aproximadamente, 210 reais por ano. Diante desses números, é de imaginar que a dignidade menstrual seja considerada um privilégio.

Mariana Betioli é obstetriz
Mariana Betioli defende que a menstruação deve ser discutida por todos os setores da sociedade. (Mariana Betioli)

Na pandemia, com muitas pessoas perdendo seus empregos e ficando sem renda, a falta de produtos para menstruação passou a ser ainda mais frequente. Por conta disso, menstruar acaba se tornando um grande fardo para as mulheres.“Moradoras de rua, mulheres que vivem em abrigos e ainda aquelas inseridas no sistema prisional são as mais vulneráveis a esse problema. Porém, ele não se restringe a um público mais fragilizado”, afirma.

A obstetriz comenta que, de forma geral, até mulheres de classe média e classe alta acabam se privando de diversas atividades durante a menstruação como ir à praia, fazer ginástica e ter relações sexuais. "É de se imaginar o que uma mulher sem recursos e educação deixa de fazer por causa da menstruação".

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É triste perceber que existem mulheres que precisam escolher entre comprar comida ou absorventes. Estamos longe de uma condição de vida digna

Mariana Betioli
Obstetriz
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IMPACTO E CAMPANHA

Aluna do ensino médio da Escola Monteiro, Laura Locatel conta o quanto ficou impactada ao participar de uma ação social e perceber a reação de uma mulher ao receber um absorvente em meio a roupas doadas. “Ela ficou muito feliz quando viu o absorvente, até gritou”, conta.

Nesse momento, Laura se atentou para a questão da pobreza menstrual e buscou realizar a campanha na instituição. “A proposta de realizar a ação na escola coincidiu com a proximidade do Dia Internacional da Higiene Menstrual e foi acolhida e incentivada pelos funcionários e outras colegas participaram. Por conta da pandemia, restringimos a campanha ao público interno, mas é interessante também promover essa reflexão, além de arrecadar absorventes, sabonetes e papel higiênico que serão doados a moradoras de rua”, explica.

Estudante Laura Locatel fez campanha para arrecadar absorventes
Estudante Laura Locatel fez campanha para arrecadar absorventes. (Divurlgação Laura Locatel)

Mariana já distribuiu, junto à Inciclo, milhares de coletores menstruais ao redor do Brasil, educando as mulheres beneficiadas no que diz respeito à sexualidade, anatomia, saúde feminina e menstruação.

Para ela, é fundamental garantir que a dignidade menstrual seja um direito a todas. Segundo a especialista, é preciso que os itens de higiene menstrual façam parte de cestas básicas e sejam distribuídos, por exemplo, pelo Sistema Único de Saúde (SUS). “No SUS, a camisinha é distribuída, mas produtos de higiene menstrual não. É como se menstruar fosse opcional”, aponta. “As políticas públicas são fundamentais para combater esse desafio. Absorventes, coletores, calcinhas menstruais não devem ser vistos como itens de luxo, e sim como necessidade básica”.

EM VITÓRIA

O Brasil tem 7,5 milhões de meninas que menstruam na escola, segundo o relatório Livre para Menstruar, divulgado em março e produzido pelo movimento Girl Up, com apoio da marca de calcinhas menstruais Herself e da organização Nossas.

Em Vitória, as vereadoras Camila Valadão (Psol) e Karla Coser (PT) enviaram, em abril deste ano, uma indicação ao prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini (Republicanos), para que absorventes menstruais sejam incluídos em cestas básicas distribuídas pela prefeitura da Capital. A sugestão visa garantir o acesso de mulheres e meninas a um item de higiene básico, mas que ainda é negado àquelas em situação de vulnerabilidade social.

Desde o ano passado, existe uma lei municipal, de autoria do ex-vereador Roberto Martins (Rede), que obriga a Prefeitura de Vitória a oferecer absorventes a estudantes nas escolas

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