Estabilidade é um contrassenso
Otto Nogami é economista e professor de economia do Insper
O que vemos no mundo empresarial, nos dias de hoje, é a constante busca de um aumento da produtividade, cujo reflexo se dá diretamente na redução de custos. O próprio processo de fusão das empresas carrega esse tipo de preocupação, ou seja, produzir mais com menos. O avanço no uso da tecnologia permite, da mesma forma, significativos aumentos de produtividade, reduzindo custos de transação e oferecendo mais competitividade.
Assim, em linhas gerais, a produtividade expressa a utilização eficiente dos fatores de produção, no caso da mão-de-obra, tendo em vista alcançar uma maior produção de bens ou serviços em menor tempo e com menores custos. Vários são os fatores que influenciam a produtividade do trabalho, tais como o desenvolvimento tecnológico dos meios utilizados para a realização do trabalho, grau de especialização e escolaridade da mão-de-obra, dentre outros.
Não se pode deixar de se considerar que é difícil de quantificar a taxa de produtividade, pois ela varia de acordo com a atividade, inclusive entre regiões ou países. Entretanto, numa breve observação, pode-se distinguir de maneira clara a diferença no ritmo de trabalho de quem está em um meio competitivo daquele que está seguro pelo fato de que, independentemente do seu desempenho, tem o seu trabalho preservado e garantido pela legislação.
A eliminação desta estabilidade, permitindo a demissão dos servidores por desempenho insuficiente, auxiliaria no enxugamento da estrutura do governo para a busca de maior eficiência, e custeio menor na manutenção da máquina administrativa. A exemplo do que ocorre na iniciativa privada, o servidor deveria passar por vários degraus para atingir posições mais altas, e que essa progressão ocorresse conforme o seu desempenho.
Outro aspecto importante a se destacar é a questão salarial. Já no início de carreira do servidor a faixa de remuneração é bem mais alta que na entrada do trabalhador da iniciativa privada, o que de certa forma o faz se acomodar, sem ter a preocupação de mostrar a sua competitividade ou apresentar soluções para melhorar o seu desempenho na função. Especialmente em funções de natureza burocrática.
Desta forma, a estabilidade do servidor público é um contrassenso quando comparado com o que ocorre na iniciativa privada. Não há um plano de carreira definido, estágios probatórios existem apenas na legislação, mas que ao final todos são aprovados, recebendo uma remuneração equivalente ao dobro do que se recebe nas empresas. Isso faz com que não haja produtividade, competitividade e meritocracia nas mais diferentes carreiras da estrutura governamental. E assim, ao invés de substituir o servidor improdutivo, contratam-se outros para que o mesmo trabalho possa ser executado, aumentando-se custos e exigindo do governo, por consequência, cargas tributárias cada vez maiores, ou endividando-se cada vez mais comprometendo o crescimento do país.
Denúncias sem risco de perder o emprego
João Domingos Gomes do Santos é presidente da Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB)
O estatuto da estabilidade é um instrumento que se conformou, ao longo dos anos, em princípio fundamental da administração pública brasileira, sendo incorporado às disposições da Constituição Federal desde 1937. No Brasil, em primeiro lugar, a estabilidade visa a manutenção do interesse público, sendo, para isso, direito legal e garantia constitucional; ela visa a proteção do Estado como res pública, ou seja, coisa do povo", coisa pública, que, no regime democrático, não pode ser tomada como propriedade de grupos privados ou de partidos políticos eventualmente no poder.
Trata-se, também, de ferramenta de gestão imprescindível à continuidade dos processos da administração pública em geral. Por isso a estabilidade é necessária como proteção do Estado democrático no sentido de resguardar o interesse público e, ao mesmo tempo, possibilitar que os servidores possam exercer o seu cargo sem coerções, podendo, inclusive, se opor aos atos dos governantes atentatórios contra os princípios da administração pública brasileira, elencados no artigo 37 da Constituição, entre os quais está a obrigação de continuidade do serviço público, o que só é possível com a estabilidade.
Frente à arbitrariedade de gestores, práticas discricionárias ou lesivas ao Estado, a estabilidade é uma proteção necessária para que os servidores possam denunciar tais medidas, sem o risco de perder o emprego. Assim, a estabilidade, como ferramenta imprescindível à administração pública em geral e meio de proteção do Estado, além de ser princípio constitucional é garantia à continuidade dos serviços públicos, preservando a res pública que, sem ela, passaria a ser um grande balcão de negócios para satisfazer os interesses dos grupos poderosos que se apropriam da coisa pública em seu benefício.
Neste sentido, observa-se que as posições radicais contrárias à estabilidade vêm das concepções políticas neoliberais ou ultraliberais, atuando para transferir os serviços de Estado para o mercado; ou de setores conservadores e atrasados que usam o Estado em benefício próprio. Por isso, preservar, fortalecer e modernizar o estatuto da estabilidade, antes de ser um privilégio, é necessidade; sem ela as funções do Estado e atos dos gestores públicos podem se degenerar e perder as suas características de coisa pública, decaindo, muitas vezes, em práticas criminosas contra a res pública, a coisa do povo. Por essas razões, a Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB) defende a estabilidade do emprego, nos serviços públicos, como direito e garantia irrenunciáveis.
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