O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) afirma ter encontrado irregularidades na homologação e na gestão dos acordos de colaboração e de leniência fechados na Operação Lava Jato.
Uma auditoria no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) e na 13ª Vara Federal Criminal, berço da operação, aponta uma 'gestão caótica' no controle das multas negociadas com delatores e empresas.
A inspeção do CNJ também retoma uma polêmica antiga da Lava Jato: a proposta de criação de uma fundação que seria gerida com recursos oriundos de uma multa de R$ 2,5 bilhões paga pela Petrobras em ação nos Estados Unidos. A força-tarefa desistiu do projeto após a repercussão negativa.
O CNJ afirma que magistrados e membros da força-tarefa tenham agido em 'conluio' para destinar as multas dos acordos de delação e leniência aos cofres da Petrobras porque sabiam que o dinheiro seria usado pela estatal para pagar a multa no exterior e que parte desses recursos voltaria para o projeto da 'Fundação Lava Jato'.
"Verificou-se a existência de um possível conluio envolvendo os diversos operadores do sistema de justiça, no sentido de destinar valores e recursos no Brasil, para permitir que a Petrobrás pagasse acordos no exterior que retornariam para interesse exclusivo da força-tarefa", diz um trecho do relatório da inspeção.
A auditoria também afirma que os acordos de delação e leniência eram homologados sem informações sobre as 'circunstâncias' ou documentos envolvendo as negociações.
Veja quem já foi ouvido na investigação do CNJ:
O relatório final do CNJ ainda está em produção, mas uma versão provisória, com as primeiras impressões de quem participou das visitas a Curitiba ao longo dos últimos dois meses, circula entre os conselheiros.
"O principal ponto do trabalho consistiu na identificação de ações e omissões que indicariam um agir destituído quanto ao zelo exigido dos magistrados nos processos", diz um trecho do documento ao qual o Estadão teve acesso.
A equipe do ministro Luís Felipe Salomão, corregedor nacional do CNJ, lidera a auditoria e já negocia com o Ministério da Justiça a criação de um grupo de trabalho para aprofundar a investigação e ampliar regras sobre acordos de delação e leniência. A ideia é convidar também representantes da Advocacia Geral da União (AGU), Controladoria Geral da União (CGU), Ministério Público Federal (MPF), Tribunal de Contas da União (TCU), Polícia Federal e Receita Federal.
A sucessão de atritos envolvendo novos e antigos protagonistas da Operação Lava Jato levaram o ministro Luis Felipe Salomão a Curitiba. O histórico de brigas e reviravoltas é extenso. Depois que a força-tarefa foi extinta e os antigos protagonistas migraram para a vida política, o juiz Eduardo Fernando Appio, crítico declarado dos métodos da operação, assumiu os processos remanescentes na 13.ª Vara Federal Criminal de Curitiba.
Ele passou a movimentar ações esquecidas na gaveta e a expor denúncias de abusos lançadas por alvos da operação, como o operador Rodrigo Tacla Duran, que afirma ter sido alvo de uma tentativa de extorsão, e o grampo ilegal instalado na cela do doleiro Alberto Youssef.
Cercado por polêmicas e alvo de pesados ataques de expoentes da Lava Jato, Eduardo Appio foi afastado do cargo após ser acusado de tentar, ele mesmo, investigar informalmente o desembargador Marcelo Malucelli, do TRF4. O desembargador é pai do advogado João Malucelli, que namora a filha do senador Sergio Moro e é sócio do ex-juiz.
No final das contas, Appio não caiu sozinho. O elo exposto do desembargador com Moro aumentou a pressão para que Marcelo Malucell se declarasse impedido para julgar processos da Lava Jato e ele acabou cedendo.
Quem assumiu temporariamente as ações penais da operação em Curitiba foi uma antiga conhecida da Lava Jato: a juíza Gabriela Hardt. Ele já havia substituído Moro quando o então juiz decidiu deixar a carreira para ser ministro da Justiça no governo Bolsonaro. A magistrada, no entanto, pediu transferência e foi substituída em meio ao pente-fino.
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