SÃO PAULO - O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse nesta segunda-feira (24) que enfrenta "um dilema" ao julgar se tornará réu o grupo de detidos em frente ao Comando do Exército no dia seguinte aos ataques golpistas de 8 de janeiro.
Em palestra no IASP (Instituto dos Advogados de São Paulo), Mendonça afirmou que é preciso distinguir a situação desse grupo daquele das 50 pessoas que foram presas em flagrante no dia dos ataques aos três Poderes.
Indicado ao STF pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o magistrado disse que não cederá a pressões e lembrou que, no julgamento do ex-deputado Daniel Silveira, acusado de ofender ministros do Supremo, votou pela condenação parcial do réu, dividindo as afirmações com conotação política daquelas que tinham o intuito de agressão.
Ao comentar sobre o voto que deverá proferir no caso, Mendonça afirmou que "um grupo agiu com violência e o outro grupo estava se manifestando, acampados na área militar de Brasília", e em relação a esse último haverá um dilema a ser superado.
"É muito mais simples definir a situação daqueles que foram presos em flagrante. Agora, a definição dos outros 50, não necessariamente. O Supremo tem um histórico de defesa das garantias em relação ao processo. Se eu aplico essa corrente mais garantista... [inaudível]. E é um dilema. Quais os contornos vão definir?"
Mendonça também questionou se o STF deveria julgar os envolvidos no 8 de janeiro, ao dizer que o tribunal consolidou uma interpretação restritiva de julgar pessoas que cometeram crimes no exercício de mandato parlamentar — o que não é o caso dos denunciados ora sob análise da corte.
"Nenhuma dessas cem pessoas está nessa situação [acusado de crime em exercício de mandato]. Esse para mim é um ponto que merece uma reflexão não apaixonada", disse.
O ministro defendeu que o julgamento não seja influenciado por valores pessoais e se atenha ao que está previsto na Constituição. "Se eu abro exceção hoje, como é que eu faço no futuro, para outros casos, para outros personagens?", indagou.
"Então tenho aqui dois grandes dilemas. A questão do juiz natural, e tenho a questão entre quais os contornos que eu vou dar na interpretação das condutas diante do marco positivado dos crimes: a questão do dolo, a questão da culpabilidade, a questão dos limites da liberdade de expressão", completou.
O Supremo Tribunal Federal iniciou no último dia 18 mês uma nova etapa relativa aos ataques golpistas de 8 de janeiro: processar e julgar os mais de mil apoiadores de Bolsonaro denunciados por envolvimento.
A corte passou a analisar se abre ações penais contra cem acusados e se mantêm os processos no Supremo. Na semana passada, o STF formou maioria para tornar réus esses cem primeiros acusados.
O ministro Luís Roberto Barroso se alinhou ao entendimento do relator, Alexandre de Moraes, e votou a favor da abertura da ação penal, assim como os ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Rosa Weber.
Com isso, já são 8 votos pela instauração dos processos, de um total de 10 possíveis. Faltam os votos do próprio Mendonça e de Kassio Nunes Marques, que precisam ser publicados ainda nesta segunda-feira (24).
Esta é a primeira leva de julgamentos das 1.390 pessoas denunciadas pela PGR (Procuradoria-Geral da República) por participarem dos ataques. A análise começou a ser feita no plenário virtual da corte na terça-feira (18), com previsão de término nesta segunda-feira (24).
O ministro Alexandre de Moraes, relator dos processos, foi o primeiro a apresentar o voto.
Ele pediu a abertura de ação penal contra cem acusados e sustentou a existência de justa causa para a abertura de ação penal de todos os acusados, divididos entre executores e autores intelectuais dos atos. Na prática, os denunciados se tornam réus.
Metade do grupo (50 pessoas) alvo dessa primeira análise é acusado pela Procuradoria de incitar a animosidade das Forças Armadas contra os Poderes e de associação criminosa. Os denunciados foram presos na manhã do dia 9 de janeiro no acampamento montado em frente ao quartel-general do Exército em Brasília.
Esses acusados compõem o que é chamado pela Procuradoria de grupo de incitadores, sem envolvimento direto no vandalismo aos prédios.
Contra as demais 50 pessoas, do grupo de executores, pesam as acusações de dano ao patrimônio público, associação criminosa, abolição violenta do Estado democrático de Direito e golpe de Estado. Esses foram presos nas dependências e nas imediações das sedes dos três Poderes.
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