É advogado. Doutor e Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo (USP)

Médico virou profissão de risco

Como ninguém está imune de ser réu em um processo judicial, e de ter de responder por anos a uma demanda, cabe ao profissional da saúde se resguardar e produzir a documentação pertinente a uma possível defesa futura

Vitória
Publicado em 27/03/2025 às 03h30

O Brasil registrou, no ano de 2024, 74.358 ações judiciais decorrentes de apontadas falhas na prestação de serviços de saúde, popularmente chamadas “ações por erro médico”, nas quais pacientes buscam reparações por danos morais ou materiais em face de profissionais da saúde. Os números indicam que, no ano passado, 203 processos por erro médico foram ajuizados a cada dia no Brasil.

Com o perdão do trocadilho, uma verdadeira epidemia de processos judiciais, os quais, segundo apuração recente do Tribunal de Justiça de São Paulo, veiculam em média pedidos indenizatórios no valor de R$ 35 mil por processo. Nos casos de morte, perda de membro ou incapacidade, o valor pode subir para a casa dos milhões de reais.

A terminologia mais atual para o fenômeno é “dano moral e/ou material decorrente da prestação de serviço de saúde”, a qual incorpora situações decorrentes de erros de prescrição e administração de medicamentos, falhas em procedimentos cirúrgicos e diagnósticos equivocados e infecções hospitalares e complicações associadas ao atendimento.

A situação parece mesmo assustadora para quem exerce a medicina. Como se proteger de tal fenômeno, como não se tornar vítima dessa epidemia judicial?

Adotar os mais altos padrões técnicos e consensos médicos nos tratamentos e procedimentos pertinentes é a medida seguramente mais capaz de trazer os melhores resultados. Todavia, ser tecnicamente impecável não resolve o problema por completo.

Mesmo o médico que age de acordo com os melhores parâmetros da profissão não está imune a um processo judicial. E para um médico bom, competente e honesto, simplesmente figurar como réu já é uma condenação, obrigando-o a contratação de advogado e assistente técnico, comparecimento a audiência e outros atos processuais, e o pior: lidar com a angústia da pendência de um processo, e a incerteza de seu resultado, por período que pode chegar a até dez anos de tramitação.

A demanda pode ser proposta sem fundamentos, o paciente pode ser motivado a partir de uma má compreensão do tratamento ou do procedimento ao qual foi submetido, ou mesmo ter sido vítima do aliciamento ou da orientação defeituosa de mau profissional do Direito. O médico precisa estar consciente desses riscos, e atuar mediante o atendimento a dois critérios fundamentais: informação e documentação.

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Médico e paciente. Crédito: Freepik

De modo geral, a prestação de serviços médicos não estabelece contra o médico uma obrigação de resultado. Não se exige garantia da cura ou do sucesso do procedimento ou da intervenção, especialmente diante das limitações do estado da técnica e da biologia humana. Informar, adequadamente, a respeito dos riscos e da possibilidade dos tratamentos é fundamental para estabelecer no paciente expectativas adequadas.

Informar, todavia, não basta. É necessário que essa informação esteja adequadamente documentada. Como ninguém está imune de ser réu em um processo judicial, e de ter de responder por anos a uma demanda, cabe ao profissional da saúde se resguardar e produzir a documentação pertinente a uma possível defesa futura.

Assim, terá condições de demonstrar que informou o paciente a respeito dos efetivos riscos do procedimento, bem como que adotou todas as medidas previstas pela técnica médica. Em ambiente judicial hostil, e dentro de uma sociedade extremamente litigante, não há espaço para os profissionais que simplesmente se asseguram a partir de sua capacidade técnica e competência. É necessária a adoção de uma cautela adicional: a preparação jurídica.

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