O julgamento dos acusados de matar o empresário Arnaldo Tesch foi adiado, novamente. É a quinta vez que isto acontece desde que o assassinato ocorreu, em outubro de 2012. De acordo com decisões judiciais constantes no processo, a maior parte dos adiamentos sucessivos do Tribunal do Júri foram ocasionados por ações da defesa dos apontados como autores do crime.
Foram denunciados pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES) a esposa do empresário, Gilvana Pires Pereira Tesch, na época com 35 anos, e o pai dela, Remi Pereira dos Santos, na época com 60 anos. Eles seriam julgados pelo crime nesta quarta-feira (16), mas houve o adiamento para data ainda não definida.
Tesch foi morto com uma facada em sua fábrica, localizada na região de Córrego do Ouro, em Santa Maria de Jetibá, Região Serrana do Estado.
Os três primeiros julgamentos foram marcados na cidade do homicídio, Santa Maria de Jetibá. Na primeira data, os réus demitiram o advogado na véspera do julgamento. O juiz local, Salim Pimentel Elias, chegou a manter a sessão do júri para confirmar, na presença dos réus, se a assinatura do documento de dispensa do advogado era verdadeira.
As duas suspensões seguintes ocorreram após pedido da defesa para que ele fosse julgado em outra cidade, com o argumento de que em Santa Maria de Jetibá o julgamento seria imparcial.
Os últimos dois júris foram agendados em Vitória, para onde o processo foi transferido. O primeiro, adiado após o advogado renunciar a defesa do réu Remi, novamente na véspera do julgamento. No último, marcado para esta quarta-feira (16), foi suspenso após novos documentos terem sido protocolados sem prazo para que a acusação tivesse tempo de analisar.
“Reputo correta a orientação jurisprudencial e doutrinária no sentido de que não basta somente o protocolo no prazo legal, sendo necessária também a cientificação da parte contrária nesse período para que não seja surpreendida e tenha o tempo mínimo suficiente para analisar os documentos e contrapô-los de forma efetiva”, disse em sua decisão a juíza Lívia Regina Savergnini Bissoli Lage, da Primeira Vara Criminal de Vitória, onde o processo tramita.
Em outra decisão do início deste mês, a juíza denominou as ações da defesa de Gilvana como “nulidade de algibeira”. Trata-se de um tipo estratégia de apresentação de documentos “numa perspectiva de melhor conveniência futura”. No processo no site do TJES, a defesa da ré é feita por cinco pessoas, mas a solicitação foi feito pelo advogado Patrick Berriel.
Informou que eles estavam segurando documentos, aguardando o momento mais oportuno para apresentá-los. “Quando se aproxima a data da realização da sessão de julgamento perante o Tribunal do Júri Popular. É o que a doutrina e a jurisprudência chamam de nulidade de algibeira”, é dito na decisão do dia 1º de novembro.
Na mesma decisão, a juíza se manifestou sobre as solicitações feitas pelo advogado da Gilvana. E destacou que o advogado da ré Gilvana, é o mesmo que renunciou a defesa de Remi e que protocolou as novas informações junto ao processo. Ele faz a defesa dela desde 2016.
“Já tendo sido designadas cinco sessões de julgamento desde o seu ingresso nos autos. Digno de registro, também, que os presentes autos foram desaforados da Comarca de Santa Maria de Jetibá e já foi designada uma sessão de julgamento perante o Tribunal do Júri desta Comarca de Vitória em 21/07/2022, sem sucesso, em razão da renúncia apresentada às vésperas da sessão de julgamento pelo acusado Remi, o que levou à redesignação do ato para o próximo dia 16/11/2022, às 09h. Nota-se, ainda, que o causídico (advogado) que renunciou à defesa do acusado Remi (às vésperas da sessão de julgamento) é o mesmo a subscrever a petição ora analisada, uma vez que também foi constituído pela acusada Gilvana e permanece exercendo a defesa da ré”.
Em outra decisão judicial, de agosto deste ano, é informado que o mesmo advogado tinha solicitado que o júri de 16 de novembro fosse adiado, informando que participaria de julgamento em outro estado e que ele não teria tempo para descansar. O pedido não foi aceito pela juíza Lívia Regina, com o argumento de que a ré possui outros três advogados.
“É imperioso destacar que o cansaço é inerente à realização das sessões de julgamento, seja por parte desta magistrada, dos membros do Ministério Público e da Defensoria Pública, não sendo diferente em relação aos advogados constituídos pelas partes, que, inclusive, são remunerados também em razão disso”, destacou em decisão.
Na avaliação do promotor de justiça Leonardo Augusto de Andrade Cezar dos Santos os adiamentos sucessivos são “manobras da defesa”. “Isto deve ser observado que só acontece como manobra de defesa, que tem medo do resultado, considerando que existem provas suficientes para condenação”.
Um dos motivos para o adiamento, aponta, é o distanciamento do julgamento da data do crime, para diminuir a lembrança da população sobre o que ocorreu. “O segundo objetivo é trabalhar com a prescrição do crime. São manobras permitidas pela nossa legislação criminal, que despreza a vítima e os seus familiares, e coloca o criminoso como o maior protegido”, destaca o promotor.
A defesa de Gilvana Pires Pereira Tesch é composta pelos advogados Patrick Berriel e Gualtemar Soares., que informaram:
- "Sobre o primeiro adiamento, a defesa informa que a opção de trocar de advogado da ré foi correta, visto que estava sem defesa técnica de qualidade. A defesa considera importante destacar que, nesta época, ao invés de ir a júri, quando seria julgada por jurados altamente imparciais e contaminados pelo preconceito, ela ganhou o direito de responder em liberdade, concedido pelo STJ.
- A decisão do ministro Sebastião Reis Júnior do STJ se baseou na inexistência de fundamento concreto para a manutenção da prisão de Gilvana. Até hoje, a defesa segue alinhada à decisão do ministro, uma vez que, dez anos se passaram desde o crime e os assassinos do empresário Arnaldo Tesch ainda não foram identificados pela polícia. Portanto, como não tinham provas contra Gilvana, não havia motivo para mantê-la presa. De mesmo modo, até hoje não há qualquer prova ou testemunha que comprove que Gilvana e Remi têm participação nesse crime.
- A respeito do desaforamento, a defesa explica que a preservação da igualdade entre as partes é garantia constitucional. Destaca estar nítido que esta condição, na época, não estava sendo respeitada, tamanha imparcialidade em que foi conduzida a investigação, desde o inquérito policial. O desaforamento foi fundamental para manter a imparcialidade dos jurados.
- A defesa considera de extrema importância relatar a decisão do ministro Ricardo Lewandowski ao dar continuidade ao caso com o desaforamento. O STF entendeu que circunstâncias imparciais fundamentaram a modificação do local do júri, como a existência de preconceito, influência financeira e política, e falta de isenção, já que informações obtidas por meio das redes sociais revelaram ainda que todos os jurados escalados tinham laços de amizade ou parentesco com a família da vítima.
- Sobre o terceiro adiamento, a defesa alega que o advogado de Remi renunciou, no entanto, o júri poderia ter sido realizado, com o julgamento de Gilvana. O Código de Processo Penal possibilita o desmembramento de julgamentos. A defesa de Gilvana estava a postos para realização do júri.
- Sobre o ocorrido em agosto de 2022, a defesa alega que não pediu o adiamento do júri, mas sim uma redesignação de somente de uma semana. Conforme relatado na petição da defesa, um dos advogados teria que atuar na defesa de outro júri popular agendado para o dia 10 de novembro. Esse julgamento, igualmente, se tratava de um caso de grande repercussão, na cidade de Araruama, região dos lagos do Rio de Janeiro, e poderia não acabar dentro do período programado. O juiz do caso já tinha reservado o plenário para, pelo menos, dois dias de júri.
A defesa alega ser importante destacar que a promotoria, por ser local, não tem a necessidade do deslocamento para estar presente nos julgamentos em que atua. Em contrapartida, os advogados operam em tribunais do júri de todo o país. Sendo assim, o advogado teria que estar em três cidades de diferentes estados no período de 4 dias. O Código de Processo Penal permite que o advogado requeira o adiamento do julgamento de forma justificada, o que foi o caso.
A defesa alega ser importante salientar que não houve qualquer interesse em protelar o júri.
- Sobre o ocorrido em 1º de novembro, a defesa ressalta que, igualmente, não solicitou adiamento do júri. Afirma que tão somente pediu que documentos importantes fossem anexados ao processo. A defesa explica que provas angariadas através de interceptação telefônica, pela própria Polícia Civil do Espírito Santo, não foram juntadas, fato que reforça a negligência da investigação. Para a defesa é espantoso provas tão importantes não terem sido anexadas. A defesa somente solicitou o que a polícia já deveria ter feito há aproximadamente 10 anos, isso se tivesse feito o seu trabalho de maneira correta. Ademais, a solicitação foi feita dentro do prazo legal e de acordo com o código de processo penal.
- Sobre o último adiamento, para a defesa, é de extrema importância que a sociedade capixaba saiba que a suspensão desse julgamento se deu porque o MP solicitou que provas importantes, as quais vão comprovar a inocência de Gilvana e Remi, fossem retiradas do processo. O que causa tamanho espanto à defesa é que essas provas foram juntadas dentro do prazo legal, de acordo com o prazo estipulado pelo código de processo penal. Mesmo assim, o MP requereu o desentranhamento dessas provas, o que acarretou com o adiamento do julgamento pelo tribunal do júri.
- A defesa considera de grande relevância citar o seguinte trecho da decisão da juíza: “Em que pesem as ponderadas considerações do Ministério Público, não há como determinar o desentranhamento dos documentos juntados pela defesa da acusada Gilvana às fs. 2966/3288 e do acusado Remi às fs. 3292/3318, na medida em que protocolizados regularmente dentro do tríduo legal.”.
Como é possível verificar, a própria juíza diz ser descabível a solicitação do MP. A magistrada com muita sabedoria determinou que as provas continuassem encartadas ao processo. Está claro que a manobra se deu por parte da acusação devido ao medo da verdade.
- O que o MP quer é ganhar tempo para poder avaliar provas que eles próprios deveriam ter investigado, mas, assim não fizeram.
É uma promotoria de acusação e não uma promotoria de justiça. A defesa finaliza sua nota com o seguinte questionamento: como pode a polícia ter as filmagens do local, feitas no dia do crime e, mesmo assim, até hoje, 10 anos após, não ter encontrado nem mesmo os executores?
Está claro que a investigação não decorreu de maneira correta e foi direcionada a incriminar os acusados. E isso será provado no tribunal do júri."
A defesa de Remi Pereira dos Santos está sendo realizada pela Defensoria Pública, segundo o site do TJES, e a reportagem ainda tenta localizar o responsável pelo caso.
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