Condenado nesta quarta-feira (19) a 146 anos e 4 meses de prisão em regime fechado pelos crimes de homicídio qualificado, estupro de vulnerável e tortura contra os meninos Kauã Sales Butkovsky, seis anos, e Joaquim Alves Sales, três anos, Georgeval Alves Gonçalves ficará preso por um tempo máximo de 30 anos, prazo que é cinco vezes menor do que a pena a ele imposta. Como já está preso há cinco anos, restará a ele cumprir mais 25 anos no presídio.
Apesar da pena longa aplicada em sentença, no caso de Georgeval, o tempo máximo de prisão é de 30 anos, segundo o artigo 75, do Código Penal, como explica o advogado Renan Sales. Em 2019, houve mudança na legislação penal, pelo pacote anticrime (Lei 13.964/19), que alterou o tempo máximo de detenção para 40 anos. Ocorre que o crime das crianças foi cometido antes, em abril de 2018, não atingindo assim o caso de Georgeval, que permanece com um prazo menor de pena, três décadas.
“Em razão de o fato ter sido cometido em 2018, quando vigia redação anterior que limitava o cumprimento em 30 anos (art. 75), o aumento não se aplica ao caso em questão, por conta do princípio da irretroatividade da lei mais gravosa (decisão do Supremo Tribunal Federal (STF)”, explica o advogado Renan Sales.
Mas quanto tempo o pastor irá cumprir de pena? Segundo a advogada Tatiana Costa Jardim, especialista em dosimetria de penas, o cumprimento da punição dele - em a sentença sendo confirmada -, começa a contar a partir do momento em que ele foi preso, o que ocorreu há cinco anos.
Assim, seriam 146 anos a serem cumpridos a partir de 2018, mas como o tempo máximo é de 30 anos, conta-se três décadas a partir de 2018. Como Georgeval já cumpriu cinco anos de prisão, resta a ele mais 25 anos a serem cumpridos em regime fechado, no presídio. “Ele terá que cumprir o tempo integral em regime fechado”, assinala o advogado criminalista Flavio Fabiano.
A advogada Tatiana Costa Jardim explica que a Lei de Execução Penal (Lei 7210/84) e o Código Penal brasileiro determinam que as penas devem ser unificadas para fins de fixação do regime inicial de cumprimento, assim como para a progressão de regime e o livramento condicional.
“No caso do Georgeval, mantida a pena de 146 anos de reclusão, este permanecerá recluso por 30 anos, contados desde o dia da sua prisão, jamais alcançando qualquer benefício no curso da sua execução penal”, observa a advogada. O que significa que ele não terá direito a pleitear a progressão de regime, ou seja, sair do fechado para o semiaberto, quando pode passar o dia fora da prisão.
Para que isso fosse possível, ele precisaria cumprir 2/5 (dois quintos) do total de sua pena (de 146 anos) para pleitear a progressão. Teria assim que ficar preso por 58 anos para ter direito a mudança de regime - de fechado para semiaberto. Tempo, segundo Tatiana, que “ultrapassa o prazo máximo de 30 anos de prisão, previstos na legislação penal à época dos fatos criminosos”.
Ele também não terá como solicitar o livramento condicional, acrescenta a advogada. Para esta medida ele teria que ficar preso por um tempo equivalente a 2/3 (dois terços) do total de sua pena para ter direito a sair em condicional e cumprir o restante da pena em liberdade. O que significa que ele teria que ficar preso 97 anos, prazo, novamente, bem superior ao tempo máximo de prisão previsto na legislação, que é de 30 anos.
Atualmente, segundo Tatiana, a partir da mudança da legislação em 2019, o tempo máximo de cumprimento de pena privativa de liberdade passou de 30 para 40 anos.
“E os condenados por crimes hediondos, como é o caso de Georgeval, com resultado morte, devem cumprir 50% da pena para pleitear a progressão de regime prisional, sendo vedada a concessão de livramento condicional. Alterações que não se aplicam a Georgeval, pois os crimes pelos quais ele foi condenado foram cometidos em 2018, ou seja, antes da referida alteração legislativa”, reafirma.
O criminalista Flavio Fabiano avalia que a defesa do pastor deverá apresentar recursos, questionando a fixação da pena base muito além do mínimo legal e por o réu ser primário. Mas ela acredita que isto não terá efeito prático no cumprimento da pena. “Mas não acredito que haja redução ou que ela irá ter alteração em relação no cumprimento da condenação, de 30 anos”, diz.
Um exemplo, segundo ele, é de que a redução da pena total caia para 90 anos. Ainda assim Georgeval precisaria cumprir 36 anos (2/5 da pena total) em regime fechado, o que também é maior do que o tempo máximo de prisão, fazendo com que precise continuar detido.
Outra possibilidade de recurso da defesa, pondera ele, é atacar uma decisão do júri. Destaca que isto ocorre quando a decisão dos jurados é manifestamente contrária às provas presentes no processo. “O que não é o caso. A materialidade, pelo que se apresenta, está devidamente comprovada, assim como a autoria do crime, por isso não acredito na anulação do júri. Pela manifestação da defesa durante o julgamento, não houve qualquer vício, o que significa ausência de causa de nulidade”, explica Fabiano.
Fabiano destaca que alguns pontos citados na defesa revelam o que foi considerado pelo juiz Tiago Fávaro Camata, que presidiu o Tribunal do Júri em Linhares, em sua sentença.
“Aplicou as qualificadoras do homicídio, que são os motivos e circunstâncias que os crimes foram praticados, bem como as causas de aumento de pena, ou seja, a condição pessoal de guardião de fato, a proximidade e o dever de cuidar do filho e do enteado, que o condenado tinha em relação às vítimas, e levando em consideração a gravidade do ato praticado contra as crianças, e também pela alta reprovabilidade da conduta, impôs pena de 146 anos de prisão, cujo cumprimento será em regime fechado”, disse Fabiano.
Renan Sales, que atuou como assistente de acusação fazendo a defesa da família das vítimas em vários casos, incluindo a da médica Milena Gottardi, assassinada pelo marido em 2017, destaca que, com base na sentença, a família das vítimas pode solicitar a reparação por danos morais.
“Com base na sentença condenatória, com ou sem trânsito em julgado, podem pedir em juízo a reparação dos danos morais causados pela conduta criminosa”.
Explica ainda que o advogado que atua como assistente de acusação no caso Georgeval também poderá recorrer contra a sentença pedindo para aumentar a pena.
“O assistente de acusação poderá, pelo menos em tese, e independentemente da vontade do Ministério Público, recorrer para majorar a pena; participar de eventuais recursos interpostos pelo condenado; acompanhar toda a fase recursal do processo, inclusive nos Tribunais Superiores, e acompanhar o processo de execução da pena visando seu fiel cumprimento”, explica.
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