Uma auxiliar de limpeza de um hospital infantil em São Caetano do Sul, no Estado de São Paulo, foi demitida por justa causa após se recusar a tomar vacina contra a Covid-19. A profissional tentou reverter a dispensa do trabalho na Justiça, mas teve o pedido negado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região.
Mas não é só a recusa à vacina que pode levar à demissão por justa causa, quando se trata do novo coronavírus. Conforme alertam especialistas, a liberdade dos funcionários "não pode se sobrepor ao direito à vida".
No Espírito Santo, ainda não há registros do tipo, segundo o superintendente regional do Trabalho, Alcimar Candeias. Ele explica, entretanto, que isso não impede que profissionais tenham sido penalizados ou até desligados sem justa causa em situações semelhantes.
A demissão por justa causa ocorre quando há uma falta grave do empregado que resulta no seu desligamento da empresa, com algumas restrições quanto ao recebimento de verbas trabalhistas. Quem é demitido nesta condição não tem direito ao saque do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), nem ao seguro-desemprego, por exemplo.
“Mas o empregador precisa justificar o porquê da demissão nesses casos, pois é o último recurso que qualquer empresa deve utilizar. Se optar por desligar o funcionário e ainda assim pagar todos os direitos trabalhistas, aí não precisa dar explicações.”
Ele explica, entretanto, que se a empresa adota como norma geral a exigência de vacinação, o empregado que desrespeita a regra pode ser penalizado. Inclusive, já existe respaldo nas normas trabalhistas para que seja feito o desligamento do trabalhador nestes casos.
Em fevereiro deste ano, o Ministério Público do Trabalho (MPT) definiu que, havendo a disponibilidade de vacina para aquele trabalhador, recusar a tomá-la sem apresentar razões médicas documentadas - como laudo que informe a sensibilidade a algum dos componentes do imunizante - pode levar à demissão por justa causa de modo a não colocar em risco a saúde dos demais empregados.
No ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) já havia deliberado que, embora não se possa forçar ninguém a receber a vacina, o Estado, por exemplo, pode impor medidas restritivas a quem se recusar a tomar o imunizante. Essas ações poderiam incluir multa, vedação a matrículas em escolas e o impedimento à entrada em determinados lugares.
A necessidade de imunização também é defendida pelo advogado trabalhista Ricardo Araújo, que observa que, além deste caso, há outras hipóteses em que o funcionário pode ser dispensado com restrição às verbas rescisórias.
“Para que o funcionário tenha a opção de vacinar-se ou não, a vacina precisa estar disponível para aquele grupo, e, no momento, ainda não está liberada para todos. Mas há outras situações em que a escolha individual coloca em risco a vida de terceiros, como, por exemplo, um funcionário que sabe que está contaminado e ainda assim vai trabalhar. Isso não apenas infringe as normas da empresa, como é considerado um crime, porque a pessoa infectada deve se isolar.”
Ele explica ainda que mesmo que não se tenha confirmação, se o funcionário suspeita que está contaminado ou teve contato com uma pessoa infectada pelo vírus e vai trabalhar normalmente sem comunicar à empresa, também pode ser penalizado.
“O empregador tem o dever de informar sobre o que a doença causa, orientar sobre as medidas de prevenção, tornar o ambiente de trabalho seguro e cobrar que todos os cuidados possíveis sejam tomados. Se a empresa educou, cobrou, e ainda assim o funcionário não cumpriu as determinações, pode ser advertido ou até mesmo demitido por justa causa.”
Araújo reforça que essas regras valem não apenas para trabalhadores na área da saúde, como em qualquer outro segmento. Mesmo em áreas em que a exposição ao risco é menor, devem ser adotados todos os cuidados para prevenir a disseminação da Covid.
“Se comprovada uma situação de contaminação em que a pessoa assumiu o risco de se contaminar ou contaminar outros, seja porque foi trabalhar doente, com suspeita, ou porque deixou de usar máscara e cumprir os requisitos de higiene e proteção, pode ser penalizado pela empresa.”
O advogado empresarial Alberto Nemer destaca que mesmo quem está trabalhando em home office também deve tomar cuidados. Nestes casos, entretanto, o funcionário já está em uma espécie de isolamento, então, caso contraia o vírus, não correrá risco de transmiti-lo aos demais colegas de trabalho.
Ainda assim, o fato deve ser comunicado à empresa até mesmo para que o empregador fique de sobreaviso sobre a possibilidade de ser necessário o afastamento e possa se organizar.
“Neste caso, parte de uma iniciativa do trabalhador. Ele deve comunicar à empresa e, se julgar que não está em condições de trabalhar, deve apresentar um laudo médico que comprove a contaminação para que possa se afastar de suas atividades. Não é só porque está trabalhando de casa que o atestado se torna desnecessário.”
Os especialistas apontam, entretanto, que caso o trabalhador minta sobre estar contaminado, apenas para não ter que trabalhar, poderá ser dispensado por justa causa. Neste caso, a empresa precisa comprovar que houve uma falha, como o empregado não ter apresentado um atestado ou se apresentou um atestado que não condiz com a doença.
“A empresa pode exigir que ele seja avaliado por um médico de confiança, ou mesmo tentar confirmar com o médico que emitiu o laudo se o documento é verdadeiro. A justa causa é o recurso final”, reforçou Araújo.
No entendimento da Justiça, empregador deve "oferecer condições dignas que protejam a saúde, a integridade física e psíquica de todos os trabalhadores que lhe prestem serviços", mas a liberdade dos funcionários "não deve se sobrepor ao direito à vida".
Uma vez que a empresa tenha cumprido seu papel de orientar o empregado, e exigir determinados cuidados, a demissão por justa causa é possível nos casos em que o trabalhador:
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