Na lista dos criminosos mais procurados do Espírito Santo, atualizada de tempos em tempos, é até difícil achar uma mulher. Só para se ter uma ideia, nesta sexta-feira (3), dos 114 nomes disponíveis no site, apenas três eram de mulheres. Com isso, surge a dúvida: quem são essas suspeitas que integram a lista das pessoas mais perigosas do Estado?
Uma coisa elas têm em comum: nenhuma é da Grande Vitória. Já os crimes pelos quais elas devem responder são variados: vão de tráfico a homicídio. Confira os nomes:
A lista está disponível no site do Disque-Denúncia, no endereço disquedenuncia181.es.gov.br/procurados. Lá é possível ver a foto dos procurados, crime pelo qual a pessoa está sendo procurada e outros detalhes.
Elis Regina é natural de Colatina, no Noroeste do Estado. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ela possui um mandado de prisão em aberto por homicídio qualificado — quando cometido à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido. A pena imposta a ela foi de 14 anos.
No site do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) há poucas informações sobre o processo dela, mas é possível conferir que o mandado de prisão foi expedido pela 2ª Vara de Santa Maria de Jetibá em maio de 2019. Em abril de 2022, ela apareceu na lista dos 20 mais procurados de Santa Maria de Jetibá, divulgada pelo Disque-Denúncia.
Elis já passou pela cadeia: segundo a Secretaria de Estado da Justiça (Sejus), ela ficou presa durante um ano, sendo liberada em outubro de 2015. À época, ela respondia por homicídio.
Jessica Batista é de São Gabriel da Palha, no Noroeste do Estado. O mandado de prisão dela é pelo crime de tráfico, expedido na cidade de Itaguaçu em abril de 2019, com pena imposta de 9 anos e 4 meses.
De acordo com a Sejus, Jessica ficou presa por mais de dois anos, de maio de 2012 a novembro de 2014, pelo crime de tráfico de drogas. Na ocasião, conforme o processo no TJES, ela foi flagrada passando uma sacola de drogas para uma adolescente; o material seria levado para uma festa em Santa Maria de Jetibá.
Sayonara Moreira é velha conhecida da polícia. Procurada desde 2013, ela chegou a ser apontada por um delegado como "herdeira" do tráfico de Village da Luz, em Cachoeiro de Itapemirim, Sul do Estado, que antes era comandado pelo pai dela, Rogério Silva.
Atualmente, Sayonara tem um mandado de prisão em aberto por tráfico de drogas, associação para o tráfico e porte ilegal de arma de fogo, expedido em 2018 pela 1ª Vara Criminal de Cachoeiro de Itapemirim.
Sayonara já era procurada pela polícia desde 2013, quando entrou para a lista dos 30 suspeitos mais buscados no Estado acusada de mandar matar um menor de idade em uma disputa por ponto de tráfico, além de um idoso. Segundo as investigações, o idoso estava incomodando a suspeita por correr atrás de justiça pela morte do filho, que foi assassinado por traficantes da facção dela.
O mandado de prisão pelo crime de homicídio não consta mais no CNJ, somente o referente a tráfico de drogas, associação para o tráfico e porte ilegal de arma. A reportagem demandou o TJES, mas o órgão disse que só conseguiria passar informações com o número do mandado de prisão, o que não é possível já que ele não consta mais no sistema do CNJ.
O advogado da família de Sayonara, José Carlos Silva, afirmou que Rogério e os familiares são vítimas de perseguição. "Sayonara Moreira nunca foi a 'herdeira do tráfico' no Village da Luz em Cachoeiro. Tal título lhe fora atribuído pelo delegado. No entanto, Tereza Silva, mãe de Sayonara, salienta que gostaria de um dia comparecer na Justiça em Cachoeiro e poder se defender de muitas acusações que de que fora vítima, mas que nunca pôde apresentar sua defesa", disse o advogado.
Por meio de nota, ele continuou dizendo que Sayonara fazia o curso de Direito e "nunca teve a pretensão de se envolver com drogas e nem com qualquer outra ilicitude. Ela está cumprindo a última etapa sua pena, estando, atualmente, trabalhando como faxineira numa igreja evangélica" em outro Estado, e "pensa em voltar a viver com dignidade e respeito às pessoas, embora lamentando as injustiças recebidas nos últimos anos".
De acordo com o oficial da Polícia Militar Hércules França, subgerente do Disque-Denúncia, não existe um critério específico para estar na lista de procurados. No início, eles faziam baseado no grau de periculosidade dos bandidos, ou seja, só os mais violentos apareciam no "catálogo do crime".
Atualmente, a lista é abastecida conforme os delegados vão enviando as informações para o Disque-Denúncia. "Isso é uma demanda que a gente recebe das delegacias regionais. Eles listam quem eles estão mais no encalço, passam as fotos, dados, e aqui a gente faz a arte e sobe para o site", detalhou França.
Segundo o oficial, a lista costuma ser atualizada regularmente. "Quase semanalmente temos pessoas para postar e retirar. Não temos uma base para saber qual critério essas delegacias têm utilizado para enviar esses nomes. Mas normalmente o processo (dos procurados) está bem adiantado, ou a pessoa já tem várias passagens, por exemplo, e por conta do histórico acaba entrando na lista. Também tem a questão do caso ter tido repercussão na região", ponderou.
Para o professor do mestrado em Segurança Pública da Universidade Vila Velha (UVV) Henrique Herkenhoff, a pouca quantidade de mulheres na lista, quando comparada a de homens, pode ter várias explicações.
"Embora hoje as mulheres ainda sejam uma minoria na criminalidade, essa proporção vem aumentando muito. O número de mulheres presas no Brasil vem crescendo muito mais rápido do que a população carcerária masculina. Da mesma forma que a mulher está ocupando mais espaços no mercado de trabalho e na sociedade em geral, o crime está inserido nisso. Esse crescimento da população feminina na cadeia e na atividade criminosa em parte espelha esse aumento da participação feminina no mercado de trabalho em geral", disse o especialista.
Até mesmo o fato das mulheres não estarem no topo da lista de procurados, segundo o professor, pode refletir a ocupação feminina no mercado de trabalho: elas não costumam ocupar os cargos mais altos da hierarquia.
Ainda de acordo com ele, a reincidência feminina no crime é menor. "Isso leva a duas coisas: menos mulheres no crime, já que uma vez que ela é punida é raro voltar; e também impede que ela suba na carreira. Os mais procurados de um modo geral são pessoas reincidentes."
Em resumo, segundo Herkenhoff, "essas divisões do trabalho e função por gênero, de como você espera que a mulher seja, isso vem no caldo cultural e é absorvido pelas pessoas. Esses papeis diferentes são muito decisivos na hora de adotar uma postura criminosa e principalmente de não sair e subir na hierarquia. Um pouco que a gente vê no mercado de trabalho se reflete nesse 'mercado' ilícito".
Um ponto que chama a atenção é que nenhuma das mulheres é da Grande Vitória. "Pode ser que esses crimes de homicídio e tráfico no interior choquem mais a população dali, porque não é algo corriqueiro. Às vezes, infelizmente, esses casos acontecem quase sempre na Grande Vitória. A gente não fez ainda uma avaliação, mas em um primeiro momento poderia ser por isso", ponderou o oficial França.
A reportagem de A Gazeta tentou contato com os advogados de defesa das mulheres citadas nesta reportagem, mas não teve retorno. O espaço segue aberto.
Quem tiver qualquer informação sobre pessoas foragidas da Justiça, pode ajudar o Disque-Denúncia através do telefone 181, ou pelo site disquedenuncia181.es.gov.br, onde é possível anexar até imagens dos suspeitos.
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