O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) decidiu, na tarde desta quinta-feira (9), soltar da prisão os juízes Alexandre Farina Lopes e Carlos Alexandre Gutmann, acusados de participar de um esquema de venda de sentença na Comarca da Serra. Mas, para isso, eles vão ter que pagar uma fiança no valor R$ 100 mil cada um.
Os magistrados estão presos preventivamente desde setembro deste ano. Farina está em uma cela no Quartel da Polícia Militar. Já Gutmann cumpre prisão domiciliar. Foi dado um prazo de 24 horas para pagamento da fiança. A expedição do alvará de soltura é imediata.
A decisão do Pleno do TJES atende a um pedido de relaxamento de prisão apresentado pela defesa do juiz Alexandre Farina e que foi estendido aos outros réus no caso. A maioria dos desembargadores votou pela substituição da prisão por medidas cautelares. Eles destacaram que manter os réus presos era "desproporcional e "inadequado".
Além do pagamento da fiança, o tribunal estipulou um conjunto de exigências para que os réus possam deixar a cadeia. Entre elas, a apreensão de passaportes e a proibição de que eles se ausentem das comarcas onde residem por mais de oito dias.
Os magistrados Alexandre Farina e Carlos Gutmann, o ex-funcionário da Associação dos Magistrados do Espírito Santo (Amages) Davi Ferreira da Gama e o empresário Eudes Cecato viraram réus no âmbito da Operação Alma Viva no dia 18 de novembro. Eles vão responder, entre outros crimes, por corrupção.
Apenas no caso de Davi, que está desempregado, não foi determinado o pagamento de fiança.
A revisão da prisão preventiva foi apresentada durante a sessão do Pleno do TJES no dia 25 de novembro. Na ocasião, a desembargadora Elisabeth Lordes, relatora do processo, citou que um dos motivos para soltar os réus era o excesso de prazo entre o oferecimento da denúncia do MPES até o seu recebimento pelo TJES. Já teriam se passado quatro meses.
Outro ponto, segundo a relatora, é que o acórdão de recebimento da denúncia ainda não foi publicado.
"Verifico circunstâncias fáticas que atrasaram a tramitação dos autos. Merecem ser relaxadas as prisões, a fim de evitar o constrangimento ilegal nas prisões”, destacou Lordes. O voto dela foi seguido por cinco desembargadores.
A votação, contudo, foi adiada após o desembargador Namyr Filho pedir vista do processo, ou seja, mais tempo para tomar a decisão. Na sessão desta quinta-feira (9), o magistrado foi o primeiro a votar e foi contra o relaxamento da prisão.
"Não identifico motivo a justificar a revisão na ordem prisional", destacou após um longo voto lido no Pleno.
Com a justificativa de Namyr, o desembargador Samuel Brasil Meira Jr mudou o voto que havia dado na sessão anterior e acompanhou o magistrado para indeferir o pedido de relaxamento.
Por sua vez, o desembargador Willian Silva votou com a relatora e disse que não havia mais motivos para manter a prisão, uma vez que a decisão já havia sido recebida pela Justiça.
"Não estamos aqui para analisar a decretação da prisão, mas a necessidade e adequação de sua manutenção. Estamos em outro momento processual. A prisão poderá voltar a ser decretada em qualquer momento, se os motivos surgirem. Mas se eles desaparecem, ela deve ser revogada, relaxada ou substituída por cautelar alternativa", afirmou o desembargado Willian Silva durante a sessão desta quinta-feira.
Apesar de a decisão não ter sido unânime, o voto da relatora foi acompanhado pela maioria dos desembargadores. Assim, foi determinada a soltura dos réus mediante pagamento de fiança.
Para o cálculo da fiança, a desembargadora informou ter levado em consideração o valor do subsídio dos magistrados, constante no Portal da Transparência do Tribunal. No caso do empresário Eudes Cecato, ela avaliou o “elevado número de empresas” existentes em nome dele.
A fiança só não vai ser aplicada no caso do acusado Davi Ferreira da Gama. “A medida não vale para o réu Davi, na forma do artigo 350, eis que comprovado encontrar-se desempregado”, informou a desembargadora.
Foi dado um prazo de 24 horas para o pagamento da fiança de R$ 100 mil. O alvará de soltura é de expedição imediata.
Além do processo criminal, os magistrados passaram a responder, pelos mesmos fatos, a um processo na seara administrativa. Nesse caso, as penas variam de advertência a aposentadoria compulsória com remuneração proporcional ao tempo de serviço.
O relator do PAD era o desembargador Robson Albanez, que foi afastado pela Corte nesta quinta-feira (9) após uma determinação do STJ no âmbito da Operação Naufrágio. O processo foi redistribuído e, agora, está sob responsabilidade do desembargador Wallace Kiffer.
Se condenados à pena máxima (aposentadoria), isso não impede que continuem a responder criminalmente pelo esquema apontado pelo Ministério Público na Operação Alma Viva.
Aposentados, no entanto, eles perderiam o foro especial e deixariam de ser julgados pelo TJES. A ação penal "desceria" para a primeira instância.
A Operação Alma Viva foi deflagrada no dia 15 de junho deste ano. Naquele dia, membros do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) cumpriram mandados de busca e apreensão nas casas de dois investigados em um esquema de venda de sentença, entre eles os empresários Eudes Cecato e o ex-funcionário da Associação dos Magistrados do Espírito Santo (Amages) Davi Ferreira da Gama.
Segundo o Ministério Público, Cecato foi beneficiado em uma decisão judicial a respeito de um imóvel na Serra. A sentença, que teria sido comprada, foi proferida em 2017 pelo juiz Carlos Alexandre Gutmann, que atuava como substituto na Vara da Fazenda Pública Estadual.
O também juiz Alexandre Farina é apontado pela investigação como um dos responsáveis por arquitetar o esquema, que contou com a participação do ex-policial civil Hilário Frasson, condenado pelo assassinato da ex-mulher, a médica Milena Gottardi. Hilário e o ex-funcionário da Amages, Davi Ferreira, teriam intermediado as negociações entre magistrados e Eudes Cecato.
O nome da operação foi inspirado no vinho chileno Alma Viva, que pode chegar a R$ 2,9 mil. Em mensagens interceptadas pela polícia, Farina prometeu que daria uma garrafa do vinho Almaviva a Hilário Frasson, como "pagamento".
Por meio de nota, o advogado Israel Jorio, que faz a defesa do juiz Alexandre Gutmann, comemorou a decisão do TJES e disse que ela representa "mais uma conquista em favor da liberdade" do seu cliente. "Com confiança e muita tranquilidade, a verdade vai sendo demonstrada e as condições de normalidade vão sendo restabelecidas", disse o advogado de defesa na nota ao ressaltar que espera a absolvição do juiz ao longo do processo.
Já o advogado Nélio Bermudes, responsável pela defesa de Davi Ferreira Gama, considera a decisão do TJES justa. "A decisão espelha a Justiça. Os fatos aconteceram em 2017, não faz sentido manter alguém preso. A prisão preventiva tem que ter uma finalidade em si mesma, para resguardar a sociedade e a instrução do processo, a coleta de provas, as testemunhas. Nesse caso, não há nenhum indício que os réus estejam tentando sair do país, se ausentar, fugir", destacou.
A Gazeta tenta contato com as defesas dos outros réus.
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