Terreno de marinha: 21 respostas sobre como a mudança afeta dono de imóvel
A PEC 39/2011, aprovada em dois turnos na Câmara dos Deputados, acaba com as taxas de marinha e permite a compra a parcelada do imóvel que pertence à União; proposta segue agora para o Senado
Publicado em 25 de fevereiro de 2022 às 14:56
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O município de Vitória concentra o maior volume de imóveis em terreno de Marinha. (Marcelo Prest/Arquivo AG)
Essa decisão, segundo Gilmar Custódio, advogado-sócio da Custódio e Schmidt Advocacia e vice-presidente jurídico da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário do Espírito Santo (Ademi/ES), varia de acordo com cada imóvel e o seu regime de ocupação.
No caso de um foreiro, que terá que pagar 17% do valor do terreno para a União, pode ser mais vantajoso, explica o advogado. Ele cita como exemplo o caso de um condomínio, em que o valor será parcelado por todas as unidades. “É uma vantagem e a pessoa ficará livre das taxas”, observa.
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PEC 39/2011 - Terreno de Marinha
Confira como fica a mudança na Constituição Federal aprovada na Câmara dos Deputados e que vai agora ser analisada pelo Senado
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Já quem está no regime de ocupação terá que pagar 100% do valor do terreno. Neste caso, orienta o advogado, é preciso analisar caso a caso, pondera Gilmar. Para uma construtora, que vai vender os apartamentos, pode ser vantajoso, mas para um só morador, o valor pode pesar.
Gilmar, que auxiliou na preparação de outras legislações sobre o assunto aprovadas em 2015, considera que a PEC 39/2011 é um avanço na legislação dos terrenos de marinha. Destaca a transferência gratuita que vai beneficiar muitas pessoas em regiões carentes.
Confira um pouco das alterações propostas pela PEC 30/2011:
A principal delas trata da propriedade das áreas consideradas terrenos de marinha e seus acrescidos, que passam a ser distribuídos:
Fica sob o domínio da União - as áreas destinadas ao serviço público federal, inclusive as que são utilizadas por concessionárias e permissionárias de serviços públicos - como as instalações portuárias -, as unidades ambientais federais, e as áreas não ocupadas
Fica com Estados e municípios - as áreas destinadas ao serviço público estadual e municipal, inclusive as destinadas à utilização por concessionárias e permissionárias de serviços públicos.
2 - COMO FICA A SITUAÇÃO DOS IMÓVEIS PARTICULARES?
A PEC 39 propõe que o domínio pleno dos imóveis de marinha passem aos foreiros ou ocupantes.
Para obter o domínio destes imóveis, porém, o proprietário terá que comprar a parte da União.
A transferência gratuita para o dono do imóvel só acontecerá no caso das áreas ocupadas por habitação de interesse social e daquelas destinadas a Estados e municípios.
3 - QUEM TEM DIREITO A COMPRAR O IMÓVEL?
Foreiros - regularmente inscritos na Secretaria de Patrimônio da União até a data de publicação da Emenda Constitucional.
Ocupantes - regularmente inscritos na Secretaria de Patrimônio da União até a data de publicação da Emenda Constitucional.
Ocupantes não-inscritos na SPU - desde que a ocupação tenha ocorrido pelo menos 5 anos antes da data de publicação da Emenda Constitucional (desde 2017) e que seja formalmente comprovada a boa-fé.
4 - A COMPRA SERÁ REFERENTE A QUAL PARCELA DO IMÓVEL?
Vai depender do regime de ocupação de cada imóvel.
Foreiro - A pessoa tem 83% do imóvel e vai ter que comprar os 17% que pertencem à União, o chamado domínio pleno. O cálculo é feito com base no terreno. Não são consideradas as benfeitorias (o que foi construído)
Ocupante - Neste caso a União é dona de 100% do imóvel, total que terá que ser desembolsado por quem quiser comprá-lo. Vale destacar que o cálculo é feito com base no terreno. Não são consideradas as benfeitorias (o que foi construído)
Foreiro - Se o imóvel (terreno, sem as benfeitorias) custar R$ 1 milhão, o proprietário terá que pagar à União R$ 170 mil (17%).
Ocupantes - No caso do imóvel custar R$ 1 milhão, o proprietário terá que pagar à União R$ 1 milhão(100%).
A exceção fica para os casos de transferência gratuita, previstas na emenda, como os imóveis em áreas de interesse social
6 - VAI TER ALGUM DESCONTO?
Segundo a proposta de emenda, na compra do imóvel serão deduzidos os valores anuais pagos de foros (0,06%) ou de taxas de ocupação (2%) nos últimos 5 anos, corrigidos pela taxa do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic)
7 - COMO FICA O CÁLCULO COM ESSE DESCONTO?
Leve em consideração o exemplo da pergunta 5:
Foreiro - Em um imóvel de R$ 1 milhão, a taxa anual de foro é de R$ 6000 (0,6%). Neste exemplo, o devido à União seria R$ 170 mil, descontado 5 anos de taxas de foro - equivalente a R$ 30 mil -, com atualização pela Selic.
Ocupantes - No caso do imóvel custar R$ 1 milhão, a taxa de anual ocupação é de R$ 20 mil. O devido à União, conforme o exemplo da pergunta 5, é R$ 1 milhão. Dele seria descontado 5 anos de taxas de ocupação - equivalente a R$ 100 mil -, com atualização pela Selic.
8 - QUEM MORA EM REGIME DE OCUPAÇÃO VAI PODER FAZER FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO?
As dificuldades para financiamentos em área de marinha acontecem nos casos de regime de ocupação, já que a União é dona de 100% do imóvel. Desta forma ele não pode ser dado em garantia ao banco, por isto a recusa ao financiamento
Com a compra do imóvel, esse entrave deixa de existir. Assim, por exemplo, se uma construtora comprar um imóvel de ocupação e construir um prédio, os apartamentos poderão ser financiados.
Já é possível utilizar o FGTS na compra de um imóvel em regime de ocupação, desde que seja pago o valor integral do imóvel, sem financiamento
Com a mudança, será possível lançar mão de financiamento e também da utilização simultânea do FGTS
10 - AS TAXAS DE FORO E OCUPAÇÃO VÃO CONTINUAR SENDO PAGAS?
Não. Segundo o artigo 2º da PEC 39/2011, fica vedada a cobrança de foro e de taxa de ocupação das áreas que vão ser transferidas, seja para Estados, municípios, ou de forma onerosa ou gratuita.
11 - O LAUDÊMIO CONTINUARÁ SENDO PAGO?
Não. Segundo o artigo 2º da PEC 30/2011, fica vedada a cobrança de laudêmio, taxa de 5% paga quando se vende o imóvel.
12 - QUAL O PRAZO DA UNIÃO PARA PÔR AS MEDIDAS EM PRÁTICA?
Até 2 anos para que sejam efetivadas as transferências previstas na Emenda Constitucional, após a sua publicação
13 - VALE À PENA COMPRAR O IMÓVEL DA UNIÃO SE FOR FOREIRO?
Gilmar Custódio, advogado-sócio da Custódio e Schmidt advocacia e vice-presidente jurídico da Ademi/ES (Associação das Empresas do Mercado Imobiliário do Estado do Espírito Santo), assinala que a decisão de compra deve ser avaliada de acordo com a realidade de cada imóvel, caso a caso.
No caso do foreiro pode ser mais vantajoso. Um exemplo: o proprietário de um apartamento cujo total a ser pago à União será dividido por todas as unidades. Vai obter o domínio pleno do seu imóvel e ficar livre das taxas de marinha.
14 - OS OCUPANTES DEVEM REALIZAR A COMPRA?
Novamente vale a orientação do advogado Gilmar Custódio, de que a avaliação varia de acordo com cada imóvel.
Um único proprietário de um imóvel de R$ 1 milhão terá que desembolsar esse valor para comprá-lo da União e pode considerar o valor pesado.
O mesmo imóvel pode ser comprado por uma construtora para a venda de futuros apartamentos, com isto a situação pode mudar e sei mais vantajoso
15 - COMO FICA A SITUAÇÃO DOS IMÓVEIS EM ÁREAS CARENTES?
Segundo a Emenda Constitucional proposta, a transferência seria gratuita para o dono do imóvel, nas chamadas áreas de interesse social.
Exemplos de áreas de interesse social em Vitória: Região da Grande são Pedro, Andorinhas, Maria Ortiz, dentre outras.
16 - A SPU PODE FAZER DEMARCAÇÃO DE OUTRAS ÁREAS DE MARINHA?
Pode, mas há exigências estabelecidas em outras leis aprovadas em 2015 para os novos processos demarcatórios.
Uma delas é a exigência de realização de três audiências públicas.
A cobrança de possíveis taxas só ocorre a partir do processo demarcatório, não mais retroagindo aos últimos 5 anos.
17 - A PEC ACABA COM OS TERRENOS DE MARINHA?
Segundo o advogado Gilmar Custódio, a chamada enfiteuse - que é o instituto dos terrenos de marinha - vem sendo esvaziada há alguns anos com a aprovação de algumas leis, como as de 2015.
Caso a PEC seja aprovada em sua íntegra, no Senado, o esvaziamento deve chegar a 80 a 85% do instituto de terrenos de marinha. “Não vai acabar, mas aos poucos será extinto”, assinala.
18 - QUAL O IMPACTO DAS MUDANÇAS PROPOSTAS PELA PEC 30/2011?
Desoneração - deixam de ser pagas as taxas ocupação e foro e o laudêmio
Facilita a comercialização - muitos compradores desistem do imóvel quando descobrem que ele está em área de marinha, em decorrência do pagamento das taxas.
Valorização do imóvel - evita, por exemplo, descontos oferecidos para compensar o pagamento das taxas de marinha
Imóveis em ocupação - vão poder ser financiados e utilizar FGTS
Extingue a relação com a União
São fatores que melhoram a liquidez do imóvel
19 - E AS MULTAS POR NÃO AVERBAÇÃO NA SPU?
Hoje é pago uma multa de 0,50%, ao mês, calculada sobre o valor do terreno, caso a pessoa não faça o registro na SPU, em até 60 dias, da compra/venda do imóvel.
A PEC não cita a multa, mas com a compra do imóvel cessa o vínculo com a União e a exigência de comunicação
20 - QUANDO AS MUDANÇAS COMEÇAM A VALER?
A PEC 39 começou a tramitar em 2011 e foi aprovada em dois turnos de votação na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (23)
Agora precisará passar pela aprovação, também em dois turnos, no Senado
21 - O QUE É TERRENO DE MARINHA?
Faixa de terra 33 metros ao longo da costa brasileira
Também são consideradas áreas de marinha os aterros, chamados de acrescidos de marinha
A demarcação é feita pela SPU, com base na LPM (linha de Preamar Médio) de 1831
Os terrenos de marinha eram listados na Constituição como bens da União
No Espírito Santo, o número de imóveis em terreno de marinha ultrapassa os 50 mil.
Quem tem imóvel nestas áreas precisa pagar taxas à União e elas variam de acordo com o regime de ocupação: foreiro (0,6%), ocupante (2%). E nos casos de venda do imóvel é preciso pagar o laudêmio (5%). Os cálculos são feitos com base no valor do terreno. Não são consideradas benfeitorias.